domingo, 8 de novembro de 2020

OS CAMINHOS DE UMA PESQUISA


  

Ester Fraga Vilas-Bôas Carvalho do Nascimento*

 

 

Na investigação histórica que resultou no livro A Escola Americana: origens da Educação Protestante em Sergipe – 1886-1913, propus rastrear a primeira escola presbiteriana secundária organizada no Nordeste, quase ausente na documentação oficial do Estado e na historiografia educacional.

A documentação confessional localizada inicialmente registrava a presença de missionários presbiterianos norte-americanos, mas nada falava a respeito de algum trabalho educacional desenvolvido em Sergipe. No entanto, existiam vestígios que apontavam para sua existência, a exemplo do túmulo da filha do missionário e educador presbiteriano Woodward Edmund Finley, que eu localizei no Cemitério Protestante de Lavandeiras.

Autores sergipanos quando trataram especificamente da educação em Sergipe sequer fizeram referência à presença de instituições educacionais protestantes no Estado, com exceção do Padre Philadelpho Jônatas de Oliveira em seus livros História de Laranjeiras (1981) e Registros de Fatos Históricos de Laranjeiras (1942), levando-me a inferir que ele retirara aquelas informações dos Livros de Tombo da Paróquia Sagrado Coração de Jesus, de Laranjeiras.

Na garimpagem das informações que pudessem subsidiar minha pesquisa, recorri a fontes de origens diversas. Foram muitas as idas a Laranjeiras, local de origem, à procura de documentação referente à Escola Americana. Tive acesso ao arquivo da Primeira Igreja Protestante de Sergipe, ao Arquivo Municipal de Laranjeiras, a arquivos particulares, além de pesquisar no Cartório de Registro de Imóveis — 1º Ofício — da Comarca de Laranjeiras e na Casa de Cultura João Ribeiro. Visitei as ruínas das duas casas onde funcionaram a Igreja e a escola, como também do cemitério e da Igreja de Lavandeiras, fotografando-os na ocasião.

Em Aracaju, consultei os acervos do Arquivo do Poder Judiciário, do Arquivo da Escola Normal, do Arquivo Público do Estado de Sergipe, da Biblioteca Pública Epifânio Dória, da Biblioteca da Loja Maçônica Clodomir Silva, do PESQUISE – Pesquisas de Sergipe, da Academia Sergipana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.

Pela inexistência de uma historiografia protestante em Sergipe, recorri aos registros sobre aquela instituição a partir de fontes produzidas pela Igreja Católica. Dentre outros temas, os jornais da época publicaram bastante os embates travados entre os convertidos à nova fé e os católicos, mas quase não registraram a presença da Escola Americana.

Uma vez que aquelas fontes se revelaram insuficientes, fui levada a buscar maiores informações em outros Estados que me facultassem compreender mais a história daquela escola. Em agosto de 1998, fui a Salvador pesquisar no arquivo da Igreja Presbiteriana do Brasil, na biblioteca do Colégio Presbiteriano Dois de Julho e na Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia.

Em Vitória, James Wright, missionário presbiteriano norte-americano, concedeu-me entrevista sobre o processo histórico de implantação daquela denominação no Brasil, cedendo-me parte dos documentos do seu arquivo particular. Ele foi a pessoa que possibilitou o desencadeamento do estudo. Faleceu dois meses depois que o conheci.

Nas viagens que fiz a São Paulo, pesquisei no Arquivo Histórico Presbiteriano, na Fundação José Manoel da Conceição, nas bibliotecas da UMESP, da UNIMEP e da Universidade Mackenzie, além das conversas que tive com o Dr. Alderi Souza de Matos, o Reverendo Eliezer Bernardes e o Dr. Hermistein Maia Pereira da Costa, que em momentos ímpares, na companhia do Dr. Boanerges Ribeiro, tomamos várias xícaras de café expresso enquanto discutíamos o tema.

As dificuldades encontradas no percurso daquela investigação me mostraram que não se aprende o ofício de pesquisador utilizando-se somente regras já estabelecidas, mas também pondo em ação elementos de um tipo de conhecimento como o faro, o golpe de vista, a intuição, os quais, para Ginzburg, são “sinônimos de processos racionais” ou “formas de discernimento e sagacidade” (Ginzburg, 1989, p. 179).

Sabendo que o documento é o resultado da construção de uma realidade feita por homens, é necessário procurar com uma lupa os rastros, traços, pequenas impressões que escapam do seu controle, os quais são “marcas digitais ou sulcos de formão que podem ser detectados por um perito”, que possibilitam compreender melhor conformações/representações culturais de determinada sociedade (Eco e Sebeok, 1991, p. 44).

O pesquisador, como um investigador, necessita inquirir, indagar, observar, treinar os olhos, a memória e a imaginação para seguir pistas, indícios, sinais – zonas privilegiadas de uma realidade opaca que permitirão decifrá-la.

 

 

* Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação/GPHPE/Universidade Tiradentes; Bolsista de Produtividade de Pesquisa em Educação pelo CNPq; Membro da Academia Sergipana de Educação, da Academia Brasileira Teológica de Letras/SE, da Academia Brasileira Rotária de Letras/SE, da Sociedade Bíblica do Brasil/SE e, do Rotary Club International/RC de Aracaju Norte/Distrito 4391. 

4 comentários:

  1. A Profa Dra Esther Nascimento nos presenteia com uma investigacao que vai alem do proposito inicial e traz elementos com uma sinergia coletiva e nos conduz a caminhos em busca de novas nuances .

    Perfeita a sua trajetoria e somos gratos pela forma em que a mesma compartilha os saberes ..bjs

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  2. Muito obrigada, Profa. Rubia Lapa! Estamos juntas neste maravilhoso caminho da produção do conhecimento!

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  3. Parabéns Dra Ester Villas Boas do Nascimento.

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