Antônio Carlos Sobral Sousa*
No início do século XX, as doenças cardiovasculares, notadamente o
Derrame e o Infarto do Miocárdio, eram responsáveis por menos de 10% de todas
as causas de morte nos EUA, passando para 25% nos anos 40 e, aproximadamente,
40%, na década de 60. A partir de 1980, com a implementação mais rigorosa de
políticas públicas de controle dos fatores de risco cardiovasculares, passou-se
a registrar declínios significativos, da mortalidade por tais doenças, atingindo
o patamar de, aproximadamente 32%, segundo a Organização Mundial da Saúde - OMS.
O Brasil acompanhava, atônito, os desdobramentos de um dos maiores
massacres da humanidade, a 2ª Guerra Mundial, sem tomar uma posição declarada
até que, no dia 15 de agosto de 1942, o submarino alemão U-507, comandado pelo capitão
de fragata, Harro Schacht, torpedeou, no litoral sergipano, as embarcações
Baependi (270 mortos) e Araraquara (131 mortos); no dia seguinte, foi a vez do
Aníbal Benévolo (150 mortos). No dia 17 de agosto, outros dois navios foram
atacados, Itagiba e Arará, na costa da Bahia, vitimando mais 56 pessoas.
Naquela época, a precariedade das estradas e a escassez de linhas
férreas faziam da cabotagem um eficaz meio de transporte de mercadorias e de
passageiros. Portanto, a significativa morte de civis, provocada pelos covardes
ataques nazistas, causou uma grande comoção nacional, forçando o então
presidente, Getúlio Vargas, a declarar guerra contra os países do Eixo – grupo
formado por Alemanha, Itália e Japão.
Afinal, o que as doenças cardiovasculares têm a ver com a nefasta
Guerra? O grupo dos Aliados, ao qual o Brasil aderiu, tinha como principais
líderes, Winston Churchill (Primeiro-Ministro da Inglaterra), Franklin
Roosevelt (Presidente dos EUA), Charles De Gaulle (Líder da Resistência
Francesa) e Josef Stalin (Líder da União Soviética). Logo após o término do
conflito, em abril de 1945, o Presidente Roosevelt, tabagista e hipertenso,
morre, aos 63 anos, vítima de AVC.
No dia do fatídico evento, a sua pressão arterial estava
absurdamente elevada (300/190 mmHg), para o conhecimento atual! Todavia,
naquela época, era desconhecido o risco causado pela hipertensão arterial, como
pode ser constatado pela análise do prontuário do presidente, que evidenciava
níveis tensionais persistentemente acima de 140/100 mmHg e era interpretado, pelo
seu médico particular, como “normal para um homem da sua idade”.
Impulsionado pela morte de seu antecessor e à luz do crescimento
epidêmico das doenças cardiovasculares, o Presidente Truman cria, um junho de
1948 o National Heart Institute e
nomeia o prestigiado professor da Harvard, Dr. Paul Dudley White, como Chefe do
Conselho Consultivo Nacional do Coração. Dr. White, juntamente com outros
especialistas em Cardiologia e em Saúde Pública, escolheram, engenhosamente, a
cidade de Framingham, localizada próximo a Boston, para sediar aquele que viria
a ser um dos mais importantes estudos de Medicina preventiva, “The Framingham Heart Study”, com o
objetivo de estudar as doenças cardiovasculares. Os investigadores recrutaram,
inicialmente, 5.209 homens e mulheres sadios que foram seguidos, rigorosamente,
tanto do ponto de vista clínico como de exames complementares. Após um ano de
relativo descrédito, assumiu a diretoria do programa, o jovem Dr. Thomas Dawber
que conseguiu, com empatia e credibilidade, consolidar o estudo, que continua
até os dias atuais, já na terceira geração de participantes.
Em 1961, Dr.
William Kannel, Dr. Dawber e col., publicaram, no prestigiado
periódico Annals of Internal Medicine,
o artigo “Fatores de Risco para o Desenvolvimento da Doença Arterial Coronária:
O Estudo de Framingham”. Neste artigo,
os autores chamaram a atenção, pela primeira vez, para a associação causal
entre a Hipertensão Arterial, a Dislipidemia, o Tabagismo, a Diabetes, a
Obesidade, o Sedentarismo, o envelhecimento e o antecedente familiar com as
doenças cardiovasculares.
Além de incontáveis produções científicas, as investigações
advindas do referido Estudo, geraram, também, um escore de predição do risco
cardiovascular, amplamente utilizado. O legado do Framingham Heart Study continua com pesquisas de ponta em genômica,
em validação de novos biomarcadores e ferramentas de imagem e em investigação
de causas familiares das doenças cardiovasculares.
Finalizo, parafraseando o Prof. Dr. Paul D. White: “Uma caminhada
vigorosa de cinco milhas (aproximadamente 8km), fará mais benefício para um adulto
infeliz, porém, saudável, do que qualquer terapia medicamentosa e psicológica
disponível”.
* Professor Titular da UFS e Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.
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