Claudefranklin Monteiro Santos*
Eu
o conheci no início dos anos 90. Havia chegado atrasado à minha primeira aula
na Universidade Federal de Sergipe, do Curso de Licenciatura em História. Morando
em Lagarto, à época levava pelo menos duas horas para me deslocar até o Campus
de São Cristóvão, num ônibus da Fátima.
Pedi
licença desconfiado, de mala e cuia, e fui me sentar nos fundos da sala sob o
olhar dos meus colegas. Ele era meu professor de Introdução à Filosofia. Com o
recato que trouxe de casa, ao término da aula, me aproximei dele para pedir
desculpas pelo atraso, no que ele irrompeu com uma frase inusitada: “- Desde
quando tabaréu de Lagarto faz nível superior?” O que se seguiu foi uma
gargalhada que lhe é muito peculiar e outra frase que conquistou a minha
simpatia: “- Relaxe, rapaz! Seja muito bem-vindo!”.
Doravante,
pudemos nos encontrar em outras oportunidades, não somente na graduação, mas principalmente
no Mestrado em Educação pela mesma instituição, quando nossos laços de amizade
se consolidaram por intermédio de um conterrâneo muito querido, o saudoso Luiz
Antônio Barreto, que não só me apadrinhava intelectualmente como também fez que
questão de me introduzir nos círculos culturais dos quais Jorge Carvalho do
Nascimento fazia parte e atuava de forma destacada e inspiradora.
E
assim tem sido Jorge para comigo desde aquela aula: generoso e atencioso. A
convivência com ele colaborou para meu amadurecimento intelectual e para saber
lidar, com sabedoria, com as tramas e os dramas das relações sociais, políticas
e culturais, sobretudo dos meios muitas vezes marcados por conveniência e
também por muitas inconveniências, boa parte delas advindas de jogos bobos de vaidades
e de disputas de poder que não levam à nada, salvo o fato de adoecer e se desgastar.
Foi
na época do Mestrado em Educação da Universidade Federal de Sergipe que tive
acesso a uma de suas obras, uma das minhas prediletas: A Cultura Ocultada (1998). Ele me presenteou com o livro depois de
uma carona da UFS para o centro de Aracaju, onde discutimos sobre a História da
Educação e a influência da filosofia alemã na cultura brasileira, sobretudo em
intelectuais como Tobias Barreto, Sílvio Romero e até mesmo Luiz Antônio Barreto.
Recentemente,
ele nos brindou com seu novo trabalho, diferente de todos os outros que
destacarei mais adiante. Trata-se de O
Carvalho (2020). Mais uma belíssima composição gráfica da Editora Criação,
sob a coordenação de Adilma Menezes. O novo livro de Jorge Carvalho está
dedicado às mulheres que cruzaram por seu caminho e que foram responsáveis por
sua formação inicial, inclusive no ambiente familiar.
As
24 crônicas e contos que compõem a obra reúnem reminiscências riquíssimas, sensíveis
e emocionantes. O Carvalho está
prefaciado por Luciano Correa e posfaciado pelo jornalista Jozailton Lima. As abas
estão assinadas por Ana Medina e sua conhecida beleza narrativa e analítica. A
apresentação ficou por conta de sua filha, a publicitária Denise Maria Oliveira
do Nascimento. Sem falar num primoroso texto de Luiz Eduardo Costa, intitulado Literatura em um tempo armado.
Nascido
em Salvador-BA, naturalizou-se sergipano, em Aracaju, vivendo intensamente a
vida cultural da cidade desde a juventude, inclusive como redator do Gazeta de Sergipe. Constituiu família
com a professora e escritora Ester Fraga Villas-Boas. É professor aposentado da
Universidade Federal de Sergipe, ex-secretário municipal de educação de Aracaju,
em duas ocasiões, e ex-secretário estadual de educação de Sergipe; fundador e
atual presidente da Academia Sergipana de Educação (ASE) e ocupante da cadeira
de nº 34 da Academia Sergipana de Letras.
Além
de Cultura Ocultada (1998) e O Carvalho (2020), Jorge Carvalho é
autor dos seguintes livros: Positivismo,
Ciência e Religião no Brasil do Século XIX: (re)lendo O Brazil Mental
(1996); Historiografia Educacional
Sergipana (2003); Memórias do Aprendizado:
80 anos de ensino agrícola em Sergipe (2004); História da Educação no Nordeste Brasileiro (2006), com Antonio
Germano Magalhães Júnior e José Gerardo; Ensino
superior, educação escolar e práticas educativas extra-escolares (2006); Intelectuais
da Educação: Sílvio Romero, José Calasans e outros professores (2007); A escola de Baden-Powell:
cultura escoteira, associação voluntária e escotismo de Estado
no Brasil (2008); Fontes para a História do Poder Legislativo
da cidade de Aracaju (1855-1965), com Ester Fraga Villas Boas; Aracaju: cidade das águas (2011), em
parceria com Luiz Antônio Barreto e Tintiliano; Os Camaristas: contribuição a História da Câmara Municipal de Aracaju
(1855-2012), com Ester Fraga Villas Boas
(2012); Muda Expressão (2017); Fé (catálogo fotográfico, 2018); Memórias da Resistência: o MDB e a luta
contra a ditadura militar em Sergipe (2019).
Pelas
razões aqui expostas e, sobretudo, por sua lavra cultural e científica, Jorge
Carvalho está entre os mais notáveis intelectuais sergipanos de nosso tempo.
Incansavelmente produtivo, segue nos presenteado com escritos dignos de
reconhecimento e aplausos. Vida longa para ele. Acima de tudo, que ele siga
sendo como o Carvalho: forte, frondoso e longevo.
*Professor do Departamento de História da
Universidade Federal de Sergipe, doutor em História e membro das Academias
Sergipanas de Letras e de Educação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário