domingo, 10 de julho de 2022

A COVID-19 E O FEITIÇO DO TEMPO


  

 

Antônio Carlos Sobral Sousa*

 

 

O Feitiço do Tempo (Groundhog Day), filme filosófico da década de 1990, dirigido por Harold Ramis e estrelado por Bill Murray no papel de Phil Connors, um insuportável meteorologista de Pittsburgh, Pensilvânia, nos EUA, que se ressente de ter sido escalado para a insignificante tarefa de reportar a celebração do Dia da Marmota, no distrito de Punxsutawney, no mesmo Estado.

Ele planejava retornar para a pujante “Cidade do Aço” logo após as festividades, todavia, uma armadilha em forma de temporal, causado por uma nevasca, o faz ficar retido na pequena localidade. O aborrecido e egocêntrico personagem passa a dormir e acordar todo dia, no mesmo dia em que gravou a reportagem.

Essa comédia estadunidense reflete o que estamos vivenciando no terceiro ano da pandemia da Covid-19, enfrentando a quarta onda da doença, com os mesmos problemas e com as mesmas controvérsias. Parece que o tempo não passa...  A sensação de déjà-vu volta a atormentar os médicos e demais profissionais de saúde, além de gestores de unidades hospitalares, por diversos motivos: inúmeros telefonemas ou Zaps de pacientes e/ou familiares aflitos por estarem contaminados pelo nefasto vírus; aumento dos atendimentos nas urgências com síndromes respiratórias, carecendo de diagnóstico diferencial sobretudo com a influenza; crescimento dos internamentos de casos graves de Covid-19, forçando o retorno de UTIs dedicadas ao tratamento da virose, com todo o aparato de segurança requerido e o receio daqueles que lidam com os enfermos, de se contaminarem e/ou de transmitirem a virose para seus familiares e entes queridos.

A elevação do número de casos e de óbitos por Covid-19 registrada ultimamente, pode ser creditada, seguramente, a alguns fatores: queda, muito precoce do uso das máscaras em locais fechados; estagnação no processo de imunização; baixa adesão à quarta dose da vacina; surgimento de subvariantes da cepa Ômicron do SARS-Cov-2, como a BA.2, muito mais transmissível que a BA.1, que nos atormentou no início do ano e as  aglomerações em eventos', notadamente o carnaval fora de época no sudeste e as festas juninas aqui no nordeste.

Apesar de incontestes evidências favoráveis à proteção chancelada pelas vacinas contra a COVID-19, sobretudo para casos graves e mortes, e, inclusive, da falta de respaldo científico da eficácia de drogas como a Ivermectina, na prevenção e no tratamento da referida virose, ainda encontramos uma legião daqueles que, veementemente, torcem contra os imunizantes e disseminam o uso do “milagroso” vermífugo e de outros componentes do chamado “Kit Covid”, em detrimento dos efeitos colaterais (alguns graves), que estas drogas podem causar.

Pesquisa recente, realizada no HCor de São Paulo, mostrou que, entre os hospitalizados neste ano, 31,8% não haviam recebido uma dose sequer da vacina e que os óbitos praticamente zeraram entre os pacientes internados acima de 40 anos de idade e com poucas comorbidades, atestando o benefício dos imunizantes.

Portanto, a pandemia ainda não acabou! Temos que continuar usando a ciência para iluminar as nossas decisões e olhar para a frente com as lições aprendidas no passado. Finalizo citando o grande imperador romano, Marco Aurélio: “O que fazemos agora ecoa na eternidade”.

 

 

* Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.

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