José Lima Santana*
Não me interessa fazer proselitismo
político, condenar ou exaltar ninguém. Quero, apenas, demonstrar a minha
indignação diante da situação do povo Yanomami. Aliás, espero uma posição firme
da Igreja Católica brasileira, através da CNBB, a esse respeito.
Causa dor e revolta a situação
exposta na imprensa e nas redes sociais, mostrando o que se poderá chamar de
gravíssima questão humanitária, embora se possa também dizer que estamos diante
de um genocídio.
Mas, nesse caso, quem propiciou esse
genocídio? Quem deixou que essa situação chegasse ao ponto que chegou? Milhares
de índios morrendo de fome e por enfermidades. Crianças, jovens e adultos,
dentre estes, idosos, esquálidos, tão aparentados, infelizmente, com os judeus
do abominável holocausto hitlerista.
Atingimos um ponto de curva o mais
reprovável possível. Especialmente, um País como o nosso, que é dos maiores
produtores de alimentos do mundo, não poderia jamais permitir que essa situação
degradante pudesse acontecer, em parte por falta de comida. É uma questão
social muito grave.
Nenhum governo poderia ser isento de
cuidar do seu povo. Os nossos povos originários são parte do povo brasileiro e
como tal devem ser cuidados. Onde esteve o governo federal? Onde esteve o
governo de Roraima? Os parlamentares daquele Estado? O Ministério Público? A
Igreja? Todas as denominações religiosas que atuam naquela região? Fazem-no
apenas para pregar o Evangelho, para aculturar os índios, arrancando pela raiz
a sua cultura nativa e deixando-os depois ao Deus dará?
Ora, o que ali prevaleceu foi a
ganância desmedida de quem invade a floresta para garimpar ilegalmente sob “as
barbas do governo”, ou, melhor, sob as suas malignas “bênçãos”. E não venham me
dizer que estou sendo severo demais. Não estou! O garimpo ilegal vem-se
tornando incontrolável nalgumas áreas.
Devastação florestal, crime ambiental
e crime continuado contra as populações afetadas pelo maldito mercúrio,
utilizado para a extração do ouro. O Estado? Omisso. Conivente. Incentivador,
talvez. O que, realmente, pode estar por trás disso? Quem poderá saber! Segundo
dados técnicos, “entre as propriedades do mercúrio, está a capacidade da forma
orgânica desse elemento se acumular ao longo da cadeia alimentar, causando a
contaminação de peixes e o risco de envenenamento de quem deles se alimenta,
inclusive seres humanos”.
A intoxicação por mercúrio “pode
provocar danos ao sistema neurológico”. As consequências “podem variar desde
dores no esófago e diarreia a sintomas de demência”. Depressão, ansiedade,
dentes moles por inflamação e falhas de memória também estão entre os sintomas.
“Um perigo ofuscado pelo brilho do ouro”.
O brilho sinistro do mercúrio, usado
em garimpos para facilitar a separação do ouro, é um risco para plantas,
animais e populações humanas. No Brasil, lamentavelmente, houve quem se
pronunciasse, de forma macabra, sobre a destinação dos nossos índios, seguindo,
por assim dizer, o pensamento do general norte-americano Philip Henry Sheridan,
autor da frase "índio bom é índio morto", que teve como pano de fundo
o genocídio de milhões de índios, promovido por desbravadores norte-americanos
durante a conquista do Oeste. Homens de governo deveriam ter a língua menos
solta. Deveriam governar mais e falar menos. Falar menos besteira. Mas, não tem
jeito: alguns têm boca de privada.
Recentemente, um jornalista foi
condenado por ter publicado um artigo no qual chamou índios Guarani-Kaiowá de
incestuosos e no qual repetiu que “índio bom é índio morto”, passando dos
limites do humor e gerando prejuízo à imagem e à moral deste povo. Com tal
entendimento, a 2ª Vara Federal em Dourados (MS) julgou procedente ação civil
pública ajuizada pelo Ministério Público Federal e condenou o jornalista ao
pagamento de indenização fixada em R$ 50.000,00 por dano moral coletivo.
A corte considerou que ele extrapolou
a liberdade de expressão ao veicular conteúdo ofensivo e pejorativo contra os
índios Guarani-Kaiowá em artigo publicado, em 2012, no portal O Tempo, de Minas
Gerais.
Quanto aos Yanomamis, espera-se que
possam receber o que lhes cabe: cuidado e proteção do governo e da sociedade.
Índio bom é índio vivo e com sua cultura preservada.
*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade
Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras,
da Academia Dorense de Letras, da Academia Sergipana de Letras Jurídicas, da
Academia Sergipana de Educação e do Instituto Histórico e Geográfico de
Sergipe.
(*) Publicado No Correio de Sergipe, edição do dia 04/02/2023, p. A-2.
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