domingo, 23 de agosto de 2020

ADEUS AO AMIGO RAYMUNDO JULIANO

 

 

 

Antonio Carlos Sobral Sousa*

 

 

Aos oito anos, em plena “idade da razão”, o jovem Raymundo aprendeu, rapidamente, o conceito fundamental da filosofia existencialista sartriana, o da liberdade. Munido de uma tosca caixa de engraxate, a fim de custear o seu divertimento, iniciava a sua caminhada de trabalhador incansável nas estreitas ruas de Estância, sua terra natal. Compelido a se inventar, logo passou a vender jornais e revistas nas cidades circunvizinhas ao “Jardim de Sergipe” e, adotando o lema de “lutar para vencer”, abraçou, definitivamente, o desafiador e fascinante mundo dos negócios. O passo seguinte, ainda pré-adolescente, foi o emprego de balconista nas Lojas Esperança, onde, para a perplexidade de muitos, passou a exercer, habilmente, o dom de comerciante nato, não parando mais de conquistar fregueses e fazer amigos!

Dotado da inquietude dos vencedores e consciente de que são suas escolhas que constroem a sua essência, o jovem Raymundo, na condição de caixeiro-viajante, passa a percorrer os caminhos tortuosos e malcuidados do interior de Sergipe e Bahia, montado no lombo de um burro, levando mercadoria para novos fregueses. A luta extenua não o desanimava, pelo contrário, servia de incentivo para seguir adiante. As trilhas que outrora percorreu, procurando sempre traçar um circuito otimizado de distância entre as cidades que visitava, servia para aguçar o raciocínio matemático necessário para o sucesso nas “trilhas” do comércio.

O esforço, a coragem e a perseverança criaram as energias propulsoras para que ele montasse o seu próprio negócio. O sonho se concretizou em 1953, com a aquisição do Bar Central de Estância, constituindo, assim, em um marco de sua vida empresarial e da economia do nosso Estado. A localização privilegiada do estabelecimento e as suas ações inovadoras na distribuição de bebidas, utilizando, inclusive, veículos de tração animal, fizeram-no prosperar. O reconhecido sucesso de Raymundo, despertou, em 1960, o interesse de empresários da “Antártica” para a formalização de uma aliança, que o tornaria representante da marca, passando, assim, a erguer a maior distribuidora de bebidas de Sergipe.

Em 1970, ele se transfere para Aracaju e funda a Distribuidora de Bebidas Raymundo Juliano (DISBERJ) e, uma década após, cria o Grupo Raymundo Juliano, diversificando os negócios, passando a atuar, também, nos ramos: atacadista, concessionária de automóveis, iluminação, hotelaria, construções, posto de combustível e agronegócio. No gerenciamento deste conglomerado de empresas, que gera empregos para centenas de sergipanos, ele conta com o apoio incondicional dos filhos Ana Suely, Cynthia e Juliano César, além dos genros, nora e netos.

Nenhum império se constrói sozinho! Conforme relata Juliana, a sua primeira esposa Suéle, compreensiva, teve participação decisiva na sua estruturação financeira e na construção do seu sonho. Todavia, uma doença fatídica roubou-lhe, prematuramente, a companheira, deixando Raymundo à deriva, apesar de contar com o aconchego de seus familiares. Mas, como todo homem de sucesso precisa, também, ser aquinhoado com sorte, ele encontra mais um porto-seguro, Ana Maria, com quem se casa, passando a desfrutar da companhia na convivência cotidiana, do estímulo em todas as dificuldades e do apoio em todas as horas.

Tive o privilégio de ser médico de Raymundo Juliano por mais de duas décadas. Durante este convívio foi possível testemunhar as suas qualidades morais, espirito agregador familiar, intensa capacidade de trabalho e liderança, que lhe fez credor da admiração do povo sergipano. No dia 21 de agosto de 2020, seu coração silenciou, deixando o mundo terreno mais pobre de homens dignos e contabilizando mais uma vítima para o pedágio da Covid-19.

 

 

*Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

BOTARAM SAL NO DOCE DO GOVERNADOR

PÓ DE SOVACO DE MORCEGO

      José Lima Santana*     Zé Calango esbravejou diante do prefeito: “O que é que você pensa, seu cabeça de vento? Que o povo é ...