José
Lima Santana*
Tendo a professora Glória encerrado suas atividades
docentes no final de 1964, o ano fatídico, no ano seguinte eu migrei para o
Educandário Nossa Senhora das Dores, regido pela professora Maria Menezes Góis,
conhecida como Dona Menininha. A mestra era formada pela Escola Normal de
Aracaju, turma de 1936. Professora aposentada da rede estadual.
A escola ficava na esquina da Rua da Noturna,
depois Dr. Edelzio Vieira de Melo (hoje, Rua Helena Feitosa) com a Rua da
Tapagem (Benjamim Constant). Era um amplo salão desprovido de quaisquer
apetrechos didáticos, salvo uns mapas envelhecidos. Bancos sem encosto e
algumas cadeiras. A professora, embora idosa, era muito boa e com ares, não de
tia, mas de avó. Nela, a paciência fizera morada.
No Educandário, eu faria os dois últimos anos do
curso primário (1965 e 1966). Uma curiosidade: foi ali que despertou em mim o
primeiro lance de namorico escolar, aos 10 anos. Uma coleguinha, como eu, do
terceiro ano, Aparecida. Chamegos de meninos, sem arroubos. Tinha dias que eu ficava
birrento e procurava tomar assento longe dela. Ela, coitada, chorava. Noutros
dias, ela trazia goiabas brancas, que eu adorava. E assim ficamos por dois
anos. Depois, ela mudou para Aracaju. Nunca mais a vi. No poema “Para Jamais
Esquecer”, publicado no livro homônimo (1989, p.97), escrevi: “Amei Aparecida,
que desapareceu, um dia, / Como uma folha morta no vento do meio-dia”.
Dona Menininha era auxiliada por suas filhas
Altair, Nãná e Dôra. Mas, Nãná era quem mais auxiliava. Pegavam muito no pé dela.
E ela não aguentando os apuros, gritava: “Mãe, olhe para Fulano”! Então,
tomavam conta dela. Alguns dos colegas eram bastante presepeiros. Zé Inácio de
“seu” Neném do Cartório, Jorge de Plácido, Paulo de Delson, Araújo de Elpídio
do Moura e outros. Nada, porém, que fugisse ao controle da velha mestra.
No terceiro ano, o livro básico era “Infância
Brasileira”. No quarto ano, era o livro “Admissão ao Ginásio”. Ainda tenho os
dois exemplares. Estudávamos à tarde. Eu morava relativamente longe, no João Ventura,
reduto da minha família, onde ainda moro. Eu saía de casa por volta das 12:30
horas. As aulas começavam às 13:00 horas, com intervalo às 15:00 horas e
encerramento às 17:00 horas.
A exemplo, das minhas duas escolas anteriores, era
multisseriada, começando no primeiro ano. No terceiro ano (1965), por minha
conta, fui à minha primeira escola, perto da minha casa, a da professora Lídia,
e pedi para estudar pela manhã (das 08:00 às 12:00 horas). Ela aceitou a minha
matrícula. Erámos três alunos, no terceiro ano: eu, Jorge de tio Carivaldo e
Dina de Joãozinho de Nila. Então, eu estudava nos dois turnos. Saía correndo da
escola, um pouco antes do meio-dia, para tomar banho de cuia (Dores só teve
água encanada a partir de 1971), almoçar, e tomar o rumo da outra escola.
Na escola municipal da professora Lídia, eu passei
a ajudá-la com os alunos do primeiro ano. Ela continuava lecionando do ABC ao
terceiro ano. Assim, tornei-me ajudante de professor aos 10 anos. Era, pois,
uma espécie de aluno-mestre, revivendo aquela categoria de alunos criada, em
Sergipe, pelo art. 5º da Lei nº 508, de 16 de junho de 1858.
Eu era muito duro com os meninos, e, por pouca
coisa, mandava repetir as lições no próximo dia. Alguns ficavam furiosos. A
professora seguia as minhas decisões nesse aspecto. Eu tomava conta dos meninos
até as 10:00 horas. Após o recreio, quando a professora ficava ouvindo as
novelas no radiozinho a pilhas, eu dava as minhas lições. Lembro-me das novelas
“O Egípcio” e “O Direito de Nascer”.
Eu era o único aluno com permissão para ficar na
sala, durante o recreio, ouvindo as novelas. Tinha dias que a professora se
derramava em lágrimas, fazendo muitas caretas. Eu tinha vontade de rir, mas me
continha. Respeitava os sentimentos da professora, que, enfim, era solteirona.
Na escola da professora Lídia, eu passei em
primeiro lugar com nota 9,8. Na da professora Menininha, eu passei em segundo
lugar, com nota 8,6. O primeiro lugar foi da minha “namoradinha” e de outra
colega, amiguinha dela, Lourdinha, que colou toda a prova. Esta colega, que era
meio-tapada, ficou zombando de mim, porque eu não logrei o primeiro lugar.
Irritado, eu disse que no ano seguinte ninguém me tomaria o primeiro lugar.
Dito e feito.
Devo a Dona Menininha o gosto pelo ato de escrever,
aos seus estímulos, às redações que ela nos passava com temas tirados das
figuras do livro “Admissão”, que ensejavam motivos para redações. E na minha
prova final do quarto ano, eu lancei, ainda de forma muito rudimentar, as
minhas primeiras quadrinhas. As provas do terceiro e do quarto ano, eu ainda as
conservo em perfeito estado.
Lembro-me muito bem que o professor Fernando
Andrade, de Matemática, do Ginásio Tertuliano Pereira de Azevedo (Colégio
Cenecista Regional Francisco Porto, a partir do início dos anos 1970, e que dirigi
de junho de 1978 a outubro de 1997) foi ao Educandário saber quais os temas
ministrados na disciplina, a fim de elaborar a prova para os exames
admissionais ao ginásio. Aliás, para mim, a Matemática era um tormento.
Do Educandário só saímos eu e Jorge de Zé Baú
(Alberto Jorge Oliveira Barreto). As provas de Português e Matemática eram
eliminatórias. Eu passei em tudo, obtendo o segundo lugar geral, ficando em
primeiro Luciano Passos de Souza, Luciano de “seu” Enoque sapateiro, egresso do
Grupo Escolar General Calasans, e que é médico ortopedista, com quem eu
comporia algumas letras para músicas, jamais musicadas. Guardo-as até hoje.
Naquele tempo, os que faziam os exames admissionais
ao Ginásio, postavam-se na Praça da Matriz, no dia e horário marcados, para
ouvir o resultado das provas, através do serviço de alto-falante da Matriz, na
voz de Dona Marizete Costa. Em 1967, eu estava, portanto, no curso ginasial.
Como presentes, por ter passado nos exames
admissionais, ganhei meu primeiro relógio de pulso e duas semanas de férias, em
Aracaju, na casa de uma prima do meu pai. Antes, eu só tinha ido a Aracaju,
quando meu pai, num acidente de caminhão (ele vendia carne de sol em Muribeca),
ocorrido no dia 29 de março de 1964, teve uma perna quebrada e a outra
fraturada. Eu tinha 9 anos, mas jamais esqueci a data.
*Padre, advogado,
professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, membro
da Academia Sergipana de Letras, Academia Sergipana de Letras Jurídicas,
Academia Dorense de Letras, Academia Sergipana de Educação e do Instituto
Histórico e Geográfico de Sergipe.
Que saudade. Fui aprovado, no final de 1959, no temível EXAME DE ADMISSÃO AO GINÁSIO, graças aos ensinamentos da Professora AÍDA COSTA, através de sua obra acima.
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