domingo, 29 de novembro de 2020

PANDEMIA DE OBESIDADE


  

 

Antônio Carlos Sobral Sousa*

 

 

A obesidade é considerada uma das principais pandemias do século XXI. Trata-se de condição clínica, caracterizada pelo excesso de tecido adiposo, criando quadro inflamatório sistêmico, associado ao aumento do risco cardiovascular e ao desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis.

Atualmente, fatores ambientais e fatores psicológicos, a saber, o sedentarismo, o trabalho excessivo, o estresse e o aumento na oferta e consumo de alimentos processados e ultraprocessados, associados a fatores metabólicos e genéticos, são responsáveis pelo balanço energético positivo e à formação de um ambiente “obesogênico”.

Segundo pesquisa recente do IBGE, um em cada quatro brasileiros, acima de 18 anos de idade, apresenta obesidade, correspondendo a 25 milhões de mulheres e 16,2 milhões de homens. Vale ressaltar que esta pandemia tem atingido, também, crianças e adolescentes, impactando na frequente ocorrência de doenças como a hipertensão arterial sistêmica e a diabetes tipo 2, outrora raros nessa faixa etária.

O tratamento conservador da obesidade, baseado na dieta hipocalórica e na prática regular de exercício físico, está bem estabelecido na promoção de perda significativa de peso e, consequentemente, na melhora da capacidade aeróbica, dos parâmetros cardiometabólicos e da qualidade de vida. Todavia, a baixa adesão, sobretudo nos grandes obesos, tem causado frustração dessa estratégia a longo prazo, levando à recuperação do peso em, aproximadamente, 95% dos casos.

Assim, a cirurgia bariátrica tem despontado como a melhor opção para o tratamento da obesidade mórbida por proporcionar perda ponderal mais sustentável do que a metodologia não invasiva. Vale observar, ainda, a significativa contribuição desta modalidade cirúrgica, para o controle de comorbidades relacionadas à obesidade (hipertensão arterial, diabetes mellitus e dislipidemia), além da redução de eventos cardiovasculares fatais e não fatais.

No Brasil, coexistem o SUS, de cobertura universal do qual dependem 150 milhões de brasileiros e a Rede Suplementar (RS), de caráter predominantemente privado, com 50 milhões de beneficiários. Há, aproximadamente, uma década os dependentes do SUS, portadores de obesidade mórbida, passaram, também, a usufruir da cirurgia bariátrica, atendendo às normas regulatórias do Ministério da Saúde.

De acordo com a Federação Internacional de Cirurgia de Obesidade e Distúrbios Metabólicos, nosso país ocupa o segundo lugar no mundo, onde mais se realiza este tipo de procedimento, ficando atrás, apenas, dos Estados Unidos.

Com o intuito de comparar as alterações dos parâmetros antropométricos, cardiometabólicos e de atividade física, entre os usuários do SUS e da RS, submetidos a cirurgia bariátrica, a nossa orientanda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UFS, Rebeca Rocha de Almeida, realizou a sua Dissertação de Mestrado, cujo produto foi publicado no periódico International Journal of Environmental Research and Public Health.

A investigação foi aprovada pela Comitê de Ética e Pesquisa da UFS e constou de 111 voluntários, sendo 60 dependentes do SUS (Hospital Universitário da UFS) e 51, da RS (Hospitais São Lucas / Rede D’Or e Primavera), operados por uma mesma equipe cirúrgica, que atua nas três instituições. Foi constatado que 72% da amostra era composta por mulheres e, no momento da admissão ao serviço de cirurgia bariátrica, os pacientes do SUS eram mais idosos, mais obesos e exibiam perfil cardiometabólico (diabetes, dislipidemia e hipertensão arterial) mais desfavorável comparativamente aos atendidos pela RS. Verificou-se, também, que a média do tempo de espera, para a realização do procedimento, foi demasiadamente maior no SUS (17 meses) do que na RS (2 meses). Durante esse período pré-cirúrgico, não se verificou nenhuma melhoria das comorbidades associadas à obesidade nos pacientes do SUS, todavia, àqueles beneficiários da RS, apresentaram melhor controle da hipertensão arterial.

Por outro lado, a constatação mais importante foi de que, a longo prazo (um ano), a cirurgia bariátrica produziu benefícios similares nos dois grupos que apresentaram redução significativa do índice de massa corporal e melhora tanto dos parâmetros cardiometabólicos como dos parâmetros ao nível de atividade física.

As autoridades de saúde têm alertado para o aumento, crescente, da obesidade, propiciada pela pandemia da Covid-19, provavelmente decorrente da inatividade física e do maior consumo calórico alimentar e pela ingestão de bebidas alcoólicas, impostos pelo confinamento domiciliar.

Portanto, vale o alerta de que se deve  adotar hábitos alimentares saudáveis, ingerir, pelo menos, dois litros de água por dia e praticar exercícios físicos regulares para prevenir ou tratar a obesidade, sem a necessidade de ter que recorrer, eventualmente, à cirurgia bariátrica.

 

 

* Prof. Titular da UFS e Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.

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