domingo, 29 de novembro de 2020

RELIGIÃO, EDUCAÇÃO, SAÚDE E A MISSÃO CENTRAL DO BRASIL

                                                       William Alfred Wadell

 

 

Ester Fraga Vilas-Bôas Carvalho do Nascimento*

 

 

Partindo de Salvador, em 1871, missionários presbiterianos norte-americanos organizaram igrejas e escolas não só no interior da Bahia, mas em Sergipe, Mato Grosso, Goiás e norte de Minas Gerais. Pela grande extensão territorial, a Missão Central do Brasil dividiu a Bahia em três regiões: Salvador, Feira de Santana e Norte da Bahia.

Os relatórios dos missionários enviados à Junta de Nova Iorque indicavam os primeiros trabalhos evangelísticos e educacionais desenvolvidos nas cidades de Salvador e de Cachoeira, informando que nesta última funcionava uma escola secundária com internatos feminino e masculino.

Em 1898, A Junta designou William Alfred Waddell superintendente das escolas da Missão Central, o qual propôs um novo tipo de instituição educacional, distinta do tipo Escola Americana de São Paulo, o Mackenzie College, mais compatível à realidade do hinterland brasileiro: uma escola secundária rural formadora de professores e de pastores no Brasil.

Na verdade, ele inspirou-se num modelo semelhante idealizado e concretizado por um colega seu, John Beatty Howell, que, em 1887, na cidade paulista de Jaú, adquiriu uma propriedade e organizou um instituto bíblico e colégio agrícola.

Em 29 de janeiro de 1906, Waddell fundou e dirigiu a Escola Americana de Ponte Nova, localizada entre Wagner e Lençóis. Até 1938, a Missão investira na construção de um complexo educacional em Wagner. O Relatório de Verificação das Instalações do Instituto Ponte Nova, realizado pela Comissão de Fiscais da Secretaria de Educação da Bahia, naquele ano, descreveu minuciosamente o Instituto Ponte Nova: o sobrado, destinado à residência do diretor e internato masculino; três pavilhões de salas de aula, dispostos em formato de U, com biblioteca, laboratório de física e química; um sobrado em estilo vitoriano, construído no ponto mais alto da fazenda, destinado à residência das alunas internas e das professoras do estabelecimento; além de uma praça de esportes.

Durante cem anos – 1871 a 1971 – os missionários vinculados à Missão Central do Brasil, partindo da Bahia, organizaram igrejas, escolas e hospitais em sua área de jurisdição. O Instituto Ponte Nova, instituição de ensino secundário rural, ofereceu durante décadas não só os cursos normal e preparatório de pastores, mas também auxiliar de enfermagem e técnico agrícola.

Após a saída da Missão, o IPN, como ficou conhecido, foi nacionalizado e integrado à Rede Pública Estadual da Bahia. Os cursos de técnico agrícola e de auxiliar de enfermagem foram oferecidos até 1999.

O sucesso daquele modelo institucional organizado por Waddell em Wagner levou a Missão a implementar, em 1923, um projeto denominado Escolas Ponte Nova. Em 1926, existiam escolas rurais em Buriti e Cáceres (Chapada dos Guimarães, Mato Grosso); Jataí e Planaltina (Chapada dos Veadeiros, Goiás). 

Nesta última cidade, foi construído um hospital. Em Rio Verde, Goiás, foram organizados pelo Dr. Donald Gordon, uma escola de enfermagem e um hospital. As atas ainda falam de um hospital em Araguaia, Mato Grosso, e de um hospital e escola em Anápolis, Goiás, estes dois últimos construídos pelo Dr. James Fanstone.

No período de atuação, a Missão Central do Brasil contou com toda a infra-estrutura necessária para implementar seus projetos. Possuía fazendas, gado, água potável, energia elétrica, tipografia, telefone, avião, veículos e serrarias (nas quais eram feitos os móveis de suas instituições).

Em Bom Jesus da Lapa havia uma fazenda com clínica, templo e escola primária, à margem do rio São Francisco, com barco motorizado. Desde a década de 1940, o avião Arauto do Rei ligava Wagner ao Sítio do Mato, Santa Maria, Cocos, Carinhanha (próximo a Minas Gerais) e vários outros pontos, geralmente transportando os alunos internos e os missionários. Além de Wagner, a Missão tinha bases em Salvador e Rio Verde, com um hangar e tambores para depósito de gasolina. Além de George Glass, a Missão contou com os pilotos-evangelistas Rodger Perkins, Bill Elton, Grady, Buyers, Trew, Reasoner e, Moore.

O trabalho institucional realizado pela Missão Central do Brasil no hinterland brasileiro ainda é pouco conhecido pela historiografia educacional brasileira, tornando-se revelador das disputas e tensões entre grupos que tinham projetos distintos. Pode-se inferir que o fato daquela organização ser presbiteriana numa região que estivera sob a ação católica durante séculos, provocou reações adversas por aqueles que não viam com bons olhos a presença de outro grupo religioso.

A Missão Central do Brasil não deixou somente indícios ou pistas, mas ações concretas na formação de homens concretos, na moldagem das almas. Há muito a pesquisar a respeito das igrejas, escolas e hospitais organizadas pela Missão Central do Brasil, a maioria ainda funcionando.

Mesmo não sendo possível fazer aqueles sujeitos falarem, poder-se-á falar das realidades de sua época, de suas prováveis intenções e ações. Necessário se faz investigar a formação de várias gerações de professores, pastores, enfermeiros, e técnicos agrícolas que serviram de propagadores daquele padrão cultural norte-americano - o presbiteriano.

 

 

* Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação/GPHPE/Universidade Tiradentes; Bolsista de Produtividade de Pesquisa em Educação pelo CNPq; Membro da Academia Sergipana de Educação, da Academia Brasileira Teológica de Letras/SE, da Academia Brasileira Rotária de Letras/SE, da Sociedade Bíblica do Brasil/SE e, do Rotary Club International/RC de Aracaju Norte/Distrito 4391.
 

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