José Fernandes de Lima*
Ao sermos colocados diante de certos
fenômenos naturais, somos provocados para descobrir se tais coisas são reais ou
não.
Uma forma abreviada de buscar essa
solução é aquela definida nos dicionários quando afirmam que realidade é tudo
que existe e que nós consideramos existentes aquelas coisas que podem ser
percebidas pelos nossos sentidos.
Isso corresponde dizer que a caneta
com que estou escrevendo é real porque pode ser detectada pelos meus sentidos,
o barulho do automóvel, a luz proveniente da lâmpada e o cheiro do café também
são reais porque podem ser detectados pelos meus sentidos.
O aparato sensorial de cada pessoa
pode traduzir de formas diferentes os estímulos recebidos do exterior, de modo
a permitir que pessoas diferentes tenham percepções distintas sobre os mesmos
estímulos recebidos. A nossa percepção pode não identificar o mundo exterior
exatamente como ele é na realidade e sim da forma como é traduzido pelos nossos
sentidos. Esse fato, porém, não altera a realidade dos objetos que deram origem
aos estímulos.
Em geral, a realidade é mais
complexa do que nós podemos perceber a olho nu. Há situações nas quais os
nossos sentidos apresentam limitações para detectar as coisas. Por isso, quando
falamos em constatar com os nossos sentidos, estamos considerando também a
possibilidade do uso de instrumentos capazes de ampliar os mesmos, como é o
caso do microscópio, que nos permite enxergar objetos muito pequenos e o caso
do telescópio, que nos permite ver objetos muito distantes. O que nos autoriza
fazer uso desses instrumentos para dizer se uma coisa existe ou não é o fato de
conhecermos o seu funcionamento.
A realidade adotada pela ciência é
mais ampla do que aquela que constatamos diretamente com os instrumentos.
Inclui também coisas que nós ainda não temos capacidade de detectar e
compreender.
Quando os nossos sentidos, mesmo
auxiliados por instrumentos, não são capazes de decidir se uma coisa é real ou
não, nós adotamos o recurso do modelo.
Diante da impossibilidade de medir
ou de verificar diretamente, nós criamos o modelo do que poderia estar
acontecendo e efetuamos testes para ver se as coisas acontecem como previsto
pelo modelo. Imaginamos o que poderia estar acontecendo e em seguida
verificamos se acontece na prática. O modelo pode ser um desenho, uma imagem, um simples cálculo matemático ou uma
grande simulação computacional.
Imaginamos o modelo e predizemos o
que teríamos de ver com os nossos sentidos se o modelo estiver correto e, por
último, verificamos se as predições estão certas ou erradas. Se estiverem
certas, a nossa confiança de que o modelo representa a realidade aumenta. Se as
previsões falharem, nós rejeitamos o modelo ou modificamos o mesmo e fazemos
novas tentativas.
É essa metodologia que permite a
contínua ampliação do conhecimento. Em outras palavras, o fato de determinadas
coisas serem hoje desconhecidas não significa que não possam vir a ser
compreendidas no futuro.
Antes de prosseguirmos, aproveito
para informar que o tema trazido acima está tratado com maestria no livro de
Richard Dawkins, denominado A Magia da Realidade, que recomendo fortemente.
Há pessoas que, diante de coisas
desconhecidas, preferem apelar para as explicações sobrenaturais. As explicações
sobrenaturais são incisivas e não admitem contestação. Dizer que uma coisa é
sobrenatural é mais do que dizer que ela não tem explicação, equivale a dizer
que tal explicação jamais acontecerá.
Essa pode não ser a melhor opção,
porque muitas coisas que no passado foram atribuídas ao sobrenatural, hoje, têm
explicações científicas que podemos compreender e nas quais podemos confiar.
O modelo de raciocínio utilizado
pelos cientistas para definição da realidade não é o único possível, mas foi
através dele que nós obtivemos um grande avanço do conhecimento.
Além de facilitar a ampliação dos
conhecimentos, a prática de confrontar as nossas primeiras impressões com a
realidade dos fatos pode ser recomendada para melhorar o relacionamento das
pessoas e para evitar muitas discussões sem propósito que verificamos nas redes
sociais.
*Físico, doutor em Física, educador, presidente da Associação Sergipana de Ciência e membro da Academia Sergipana de Educação.
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