domingo, 14 de novembro de 2021

IVERMECTINA: DE VERMÍFUGO A ANTIVIRAL


  

 

Antônio Carlos Sobral Sousa*

 

 

A ivermectina, apesar da sua ampla utilização veterinária no combate a parasitas tanto na pecuária, como em pets de estimação (notadamente cães e gatos), era pouco conhecida, uma vez que, em humanos, é indicada, apenas, para o tratamento de algumas verminoses, como a estrongiloidíase e certas pediculoses, como o piolho. Todavia, bastou a demonstração de que a referida droga pode diminuir a replicação do SARS-CoV-2 in vitro, ou seja em laboratório de experimentação, para que ela se transformasse em um dos produtos farmacêuticos mais populares dos últimos dois anos.

De uma forma surpreendente, a droga passou a ser utilizada, tanto para a prevenção, como para o tratamento da Covid-19, mesmo após os estudos clínicos, randomizados, não terem evidenciado benefícios em nenhuma das duas modalidades de terapêutica.

O número de adeptos da ivermectina, utilizando as mais variadas e bizarras posologias, cresceu a ponto de provocar, frequentemente, o seu esvaziamento das prateleiras das farmácias, forçando os ávidos usuários a recorrerem a lojas de produtos veterinários. Esta constatação, levou o Conselho Federal de Farmácia a emitir alerta sobre a falta de estudos conclusivos acerca da eficácia da referida droga no tratamento da Covid-19, bem como sobre as consequências do uso de sua apresentação veterinária em humanos. Vale ressaltar, ainda, que os medicamentos para uso em animais são registrados no Ministério da Agricultura, enquanto que, os para humanos, na ANVISA.

Foi publicado, recentemente, no conceituado periódico New England Journal of Medicine, um artigo (doi: 10.1056/NEJMc2114907), que chama a atenção para o incremento, significativo, de notificações feitas aos centros reguladores americanos, do uso inapropriado da ivermectina, causando efeitos adversos potencialmente graves, tais como: confusão mental severa, ataxia (equilíbrio ou coordenação motora prejudicados), convulsões e hipotensão, requerendo, muitas vezes, internação hospitalar. Têm sido relatados, também, sintomas leves, como: distúrbios gastrointestinais, tonturas, cefaleia, alterações visuais e rash cutâneo (surto temporário de manchas ou pápulas avermelhadas, na pele). É importante alertar, ainda, que os efeitos tóxicos da droga podem ser potencializados pela condição clínica do paciente, com suas comorbidades e pela eventual interação medicamentosa.

Portanto, diante da incerteza do tratamento desta iníqua virose, devemos adotar e disseminar as medidas preventivas, cientificamente comprovadas: vacinação em massa, uso de máscara, higienização das mãos e optar por ambientes com ventilação adequada. Termino, parafraseando o destacado dramaturgo germânico, Berthold Brecht: “A ambição da Ciência não é abrir a porta do Saber Infinito, mas pôr um limite ao Erro Infinito”.

 

 

*Professor Titular da UFS e Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.

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