domingo, 22 de maio de 2022

COVID LONGA


  

 

Antônio Carlos Sobral Sousa*

 

 

Estamos no terceiro ano da Pandemia da Covid-19 e ainda não foi completamente desvendado todo o potencial nocivo de seu protagonista, o enigmático vírus batizado de SARS-Cov-2. Já estão bem estabelecidas as nefastas complicações da fase aguda da doença, muitas vezes fatais, apresentadas atualmente, sobretudo, por aqueles que ainda negam as vacinas e por grupos vulneráveis, como os idosos e os imunocomprometidos. Todavia, quando uma pessoa, infortunadamente acometida pela virose pode ser taxada de “recuperada”? Ou melhor, quando ela se livra, definitivamente, dos sintomas da doença?

Muitos pacientes continuam a relatar queixas como “falta de ar”, “esquecimento”, “peso no peito”, “dores musculares”, “palpitações” e “fadiga”, mesmo tendo passado pela fase aguda da doença meses atrás e terem sido declarados curados, por não mais testarem positivo para o RNA do novo coronavírus.

Um editorial publicado em outubro de 2020, na icônica revista britânica Nature (doi: 10.1038/d41586-020-02796-2), já alertava para as formas prolongadas de Covid-19, enfocando a necessidade e importância da adoção de uma terminologia apropriada para esses casos, de se definir critérios para recuperação da doença, e de se levar em consideração os pontos de vista dos pacientes. Essa ampla gama de sintomas que podem durar semanas, meses ou até mesmo anos, após a infecção, e que pode desaparecer e recrudescer, tem sido denominada de “Síndrome da Covid Longa”.

O prognóstico desta nova entidade médica não é totalmente conhecido e, provavelmente, depende da gravidade do quadro clínico, das comorbidades subjacentes e da resposta ao tratamento. A Organização Mundial da Saúde estima que 10% a 20% daqueles acometidos pela doença desenvolvem Covid prolongada, e que se trata de um problema de saúde pública, em decorrência das potenciais implicações sociais, econômicas e trabalhistas.

Acaba de ser publicado um estudo (doi: 10.1093/trstmh/trac030), desenvolvido pela Fiocruz Minas Gerais, constatando que, surpreendentemente, metade das pessoas diagnosticadas com Covid-19 apresentaram sequelas que podem perdurar por mais de um ano.

Dentre os 646 voluntários acompanhados pelos 14 meses de duração da pesquisa, os investigadores contabilizaram 23 sintomas, após o término da infecção aguda, sendo a fadiga, caracterizada por cansaço extremo e dificuldade para realizar atividades rotineiras, a principal queixa, relatada por 35,6% dos participantes.

Entre as sequelas mais mencionadas, destacam-se: tosse persistente (34,0%), dificuldade para respirar (26,5%), perda do olfato ou paladar (20,1%) e dor de cabeça (17,3%). Chamam a atenção, ainda, os relatos de transtornos mentais (insônia - 8%; ansiedade - 7,1%; e tontura - 5,6%) e variações da pressão arterial (7,4%). Foram verificados também casos graves, como trombose, em 6,2% da população monitorada. A maioria dos pacientes se recuperou em cinco meses, todavia, alguns continuaram sintomáticos durante todo o período da investigação.

A síndrome permanece ignorada por muitos e pode acometer mesmo aqueles que apresentaram sintomas leves na fase aguda, ela se constitui um novo desafio para a ciência, devido à falta de informações sobre as manifestações tardias da doença. Portanto, não se trata de uma “gripezinha”. Finalizo citando o célebre cientista e matemático inglês, Isaac Newton: “O que sabemos é uma gota. O que não sabemos é um oceano”.

 

 

* Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.

 

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