Antônio Carlos Sobral Sousa*
Estamos no terceiro ano da Pandemia da Covid-19 e ainda não foi
completamente desvendado todo o potencial nocivo de seu protagonista, o
enigmático vírus batizado de SARS-Cov-2.
Já estão bem estabelecidas as nefastas complicações da fase aguda da doença,
muitas vezes fatais, apresentadas atualmente, sobretudo, por aqueles que ainda
negam as vacinas e por grupos vulneráveis, como os idosos e os
imunocomprometidos. Todavia, quando uma pessoa, infortunadamente acometida pela
virose pode ser taxada de “recuperada”? Ou melhor, quando ela se livra,
definitivamente, dos sintomas da doença?
Muitos pacientes continuam a relatar queixas como “falta de ar”,
“esquecimento”, “peso no peito”, “dores musculares”, “palpitações” e “fadiga”,
mesmo tendo passado pela fase aguda da doença meses atrás e terem sido
declarados curados, por não mais testarem positivo para o RNA do novo
coronavírus.
Um editorial publicado em outubro de 2020, na icônica revista
britânica Nature (doi:
10.1038/d41586-020-02796-2), já alertava para as formas prolongadas de
Covid-19, enfocando a necessidade e importância da adoção de uma terminologia
apropriada para esses casos, de se definir critérios para recuperação da
doença, e de se levar em consideração os pontos de vista dos pacientes. Essa
ampla gama de sintomas que podem durar semanas, meses ou até mesmo anos, após a
infecção, e que pode desaparecer e recrudescer, tem sido denominada de
“Síndrome da Covid Longa”.
O prognóstico desta nova entidade médica não é totalmente
conhecido e, provavelmente, depende da gravidade do quadro clínico, das
comorbidades subjacentes e da resposta ao tratamento. A Organização Mundial da
Saúde estima que 10% a 20% daqueles acometidos pela doença desenvolvem Covid
prolongada, e que se trata de um problema de saúde pública, em decorrência das
potenciais implicações sociais, econômicas e trabalhistas.
Acaba de ser publicado um estudo (doi: 10.1093/trstmh/trac030),
desenvolvido pela Fiocruz Minas Gerais, constatando que, surpreendentemente,
metade das pessoas diagnosticadas com Covid-19 apresentaram sequelas que podem
perdurar por mais de um ano.
Dentre os 646 voluntários acompanhados pelos 14 meses de duração
da pesquisa, os investigadores contabilizaram 23 sintomas, após o término da
infecção aguda, sendo a fadiga, caracterizada por cansaço extremo e dificuldade
para realizar atividades rotineiras, a principal queixa, relatada por 35,6% dos
participantes.
Entre as sequelas mais mencionadas, destacam-se: tosse persistente
(34,0%), dificuldade para respirar (26,5%), perda do olfato ou paladar (20,1%)
e dor de cabeça (17,3%). Chamam a atenção, ainda, os relatos de transtornos
mentais (insônia - 8%; ansiedade - 7,1%; e tontura - 5,6%) e variações da pressão
arterial (7,4%). Foram verificados também casos graves, como trombose, em 6,2%
da população monitorada. A maioria dos pacientes se recuperou em cinco meses,
todavia, alguns continuaram sintomáticos durante todo o período da
investigação.
A síndrome permanece ignorada por muitos e pode acometer mesmo
aqueles que apresentaram sintomas leves na fase aguda, ela se constitui um novo
desafio para a ciência, devido à falta de informações sobre as manifestações
tardias da doença. Portanto, não se trata de uma “gripezinha”. Finalizo citando
o célebre cientista e matemático inglês, Isaac Newton: “O que sabemos é uma
gota. O que não sabemos é um oceano”.
* Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e
Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.
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