Antônio Carlos Sobral de Sousa*
A pandemia que reluta em acabar, escancarou a falta de atenção à
saúde mental da população mundial, negligenciada pelas autoridades competentes.
Segundo um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgado no início
do ano, a prevalência global de ansiedade e depressão incrementou em 25%,
somente no primeiro ano da virose.
Vale ressaltar que este aumento de transtornos mentais coincidiu
com fechamento da maioria dos serviços ambulatoriais, por conta das restrições
impostas pela desconhecida virose, promovendo, perigosamente, consideráveis
lacunas no acompanhamento daqueles que mais necessitavam.
A dificuldade para o atendimento presencial fez com que muitas
pessoas buscassem suporte online, esbarrando na carência de ferramentas
digitais confiáveis, eficazes e de fácil acesso. No entanto, desenvolver e
implantar tais tecnologias, particularmente útil em um país com dimensões
continentais como o nosso, constitui um grande desafio em decorrência da limitação
de recursos para tal fim.
O tema também foi abordado em um artigo recém-publicado no
conceituado periódico JAMA (doi:10.1001/jama.2022.10241) o qual destaca que uma
em cada oito pessoas, em todo o mundo, apresenta algum tipo de transtorno
mental, alertando, ainda, para situações mais graves como o suicídio,
responsável por uma em cada cem mortes, constituindo a principal causa de óbito
em adolescentes.
Todavia, a maioria dos governos destina, em média, apenas 2% de
seus orçamentos em saúde para a prevenção e tratamento das doenças mentais. A
situação é mais dramática nos países menos abastados, que destinam, para este
fim, parcelas ainda menores. Dada a escassez, per capta, de psiquiatras em
países de média e baixa renda, aproximadamente 71% dos portadores de psicoses
não têm acesso ao tratamento adequado.
Como resultado, a doença mental é uma das principais causas de
incapacidade em todo o mundo, promovendo um enorme custo financeiro. O Fórum
Econômico Mundial estimou que as condições clínicas que resultam em incapacidade
mental custaram, US$ 2,5 trilhões em 2010 e projetam uma majoração para US$ 6
trilhões até 2030.
Segundo os especialistas, a saúde mental tem comportamento fluido,
mudando durante as vidas das pessoas à medida que elas enfrentam situações
estressoras. A tensão emocional, sem precedentes, vivenciada nos tempos de
pandemia, causada pelo isolamento físico imposto pelas restrições ao trabalho
presencial, ao apoio de entes queridos e ao envolvimento comunitário,
contribuiu seguramente para a explosão de casos de transtornos de ansiedade e
depressão, sobretudo nos países mais afetados pela virose.
A solidão, o medo de se infectar, o sofrimento e a morte de
pessoas queridas, além do luto e de preocupações financeiras, são, também,
estressores não desprezíveis. Entre os profissionais de saúde, a exaustão tem
sido considerada um importante gatilho para o pensamento suicida.
Finalizo, citando o diretor-geral da ONU, Tedros Adhanom Ghebreyesus:
“as informações que temos agora sobre o impacto da COVID-19 na saúde mental do
mundo são apenas a ponta do iceberg”.
* Professor Titular da UFS e Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.
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