José Lima Santana*
A partir
de maio de 1925, em vista da reforma constitucional proposta pelo presidente
Artur Bernardes, Dom Leme, então arcebispo coadjutor do Rio de Janeiro, e o
sergipano Jackson de Figueiredo — fundadores do Centro Dom Vital, na época o
principal centro intelectual do catolicismo conservador no país — iniciaram
intensa campanha em prol da implementação de “emendas religiosas” à
Constituição de 1891.
Essas
emendas referiam-se à obrigatoriedade da instrução religiosa nas escolas
públicas e ao reconhecimento do catolicismo como religião oficial do país. Essa
última pretensão era, deveras, absurda. Não havia mais lugar para regressar ao
que ocorrera na fase imperial. Nem pensar.
Entretanto,
após a Revolução de 1930 o Estado passou a conceder um reconhecimento quase
oficial à Igreja. Necessitando de seu apoio para legitimar o novo governo,
Vargas não hesitou em fortalecê-la. A permissão para que fosse ministrada
instrução religiosa nos cursos primário, secundário e normal, bem como a
licença para que se organizassem sindicatos católicos — ambas concedidas
durante o ano de 1931 — constituíram indícios dessa aproximação.
Enfim, em
1932, no Rio de Janeiro, foi criada a Liga Eleitoral Católica - LEC, pelo agora
segundo cardeal brasileiro, Dom Sebastião Leme da Silveira, que contou com o
auxílio de Alceu Amoroso Lima. O objetivo era mobilizar o eleitorado católico
para que este apoiasse os candidatos comprometidos com a Doutrina Social da
Igreja, nas eleições de 1933 para a Assembleia Nacional Constituinte, que promulgaria
a Constituição de 1934, e de 1934 para as assembleias constituintes estaduais.
A partir
da segunda metade de 1932, a propaganda da LEC intensificou-se através da
publicação na imprensa de artigos contra o divórcio e a favor da instrução
religiosa. Começaram a ser divulgados igualmente os nomes dos partidos e
candidatos apoiados pela organização. Em Sergipe, para a constituinte estadual
de 1935, a Igreja conseguiu eleger deputado o Cônego Miguel Monteiro Barbosa,
que já era ativo na política.
A LEC teve,
inclusive, entre nós, como seu diretor espiritual, o padre Avelar Brandão
Vilela, que seria arcebispo primaz do Brasil, em Salvador. Em 1935, foi formada
a Ação Católica Brasileira (ACB), nova organização religiosa cujo objetivo era
coordenar todas as forças católicas do país para difundir os princípios da
Igreja.
De
início, houve dificuldade para se definir a relação dessa organização com a
LEC. Pouco depois, a LEC foi considerada órgão paralelo à ACB e diretamente
subordinado aos princípios gerais da Igreja.
Em 10 de
novembro de 1937, ao mesmo tempo em que instituiu o Estado Novo, Getúlio Vargas
outorgou nova Constituição ao país, revogando a Carta de 1934. Pouco depois,
todos os partidos políticos foram extintos. A LEC passou à inatividade, tendo
seu funcionamento impedido.
No
entanto, embora a nova Constituição não especificasse as questões referentes à
Igreja, Vargas continuou a solicitar o apoio desta, concedendo-lhe as mesmas
“garantias e liberdades” de antes.
A LEC
atuou ainda nas eleições presidenciais de 1945, nas eleições para a Assembleia
Constituinte de 1946 e nas eleições presidenciais de 1950. Para a Constituinte
estadual de 1947, os católicos sergipanos elegeram como deputado o cônego Edgar
Brito.
Em 1962,
em meio a certo rebuliço, a LEC passou a denominar-se Aliança Eleitoral pela
Família (ALEF). Começou a sua decadência, que se acentuou após o golpe militar
de 1964. Extinguiu-se. A partir dali a Igreja Católica, ausente da política
partidária, não deixou de atuar em duas frentes, não como instituição, mas pela
ação deliberada de seus membros clericais – bispos e padres –, que se
dividiram, uns apoiando o golpe e outros combatendo-o. Passou-se, então, a
dizer que havia o clero de direita e de esquerda.
Politicamente,
a Igreja Católica perdeu terreno para as denominações protestantes,
especialmente as de orientação neopentecostal. Aliás, dizem alguns estudiosos
da ação pastoral católica que a ascensão do protestantismo neopentecostal
deveu-se, em grande parte, ao abandono pela Igreja Católica das ações que se
voltavam, a partir do Concílio Vaticano II e, notadamente, das opções
estabelecidas durante a Segunda Conferência Geral do Episcopado
Latino-americano, em Medellín, na Colômbia, em 1968, e a Terceira Conferência,
realizada em Puebla, no México, em 1979: opções preferenciais pelo jovens e
pelos pobres.
No caso
dos pobres, acusam alguns prelados e outras pessoas ligadas aos estudos sobre a
Igreja Católica que as lideranças desta deixaram de lado os pobres das
periferias e de comunidades cujos habitantes são excluídos das benesses da
sociedade e das políticas públicas, que não atendem as suas necessidades,
marginalizando-as, pois.
A
derrocada, no Brasil, das comunidades eclesiais de base – CEBs –, dizem, é
prova disso, ou seja, do abandono pela Igreja, favorecendo, assim, o surgimento
e o aumento das denominações protestantes neopentecostais, que vão cada vez
mais se afirmando no contexto político nacional.
A Igreja
Católica dormiu, na ação política. Parece viver enclausurada nas quatro paredes
dos templos e, ainda assim, o clero não consegue se unir, sequer, para levar
adiante, e a bom termo, a DSI - Doutrina Social da Igreja. Uma pena! Esclareço
que “ação política” significa a luta em prol do povo, que deve ser assistido,
espiritualmente, mas, também, naquilo que, socialmente, lhe seja favorável para
a afirmação da dignidade da pessoa humana.
As atuais
divisões intestinas na Igreja só servem para diminuí-la como instituição. Às
vezes, alguns dos membros de sua hierarquia – “alto” e “baixo” clero – lutam
por posições ou para desestabilizar uns aos outros. As vaidades e as
mediocridades estão à solta e estão em alta, nalguns momentos e nalguns
lugares. Alguns não rezam a Oração de São Francisco: “Onde houver ódio, que eu
leve o amor”. E “onde houver ofensa, que eu leve o perdão”.
*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras, da Academia Dorense de Letras, da Academia Sergipana de Letras Jurídicas, da Academia Sergipana de Educação e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.
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