Antônio
Carlos Sobral Sousa*
Alguns
pacientes têm relatado ampla gama de sintomas que podem durar semanas, meses ou
até mesmo anos, após a infecção aguda pelo SARS-Cov-2, que pode desaparecer e
recrudescer, e tem sido denominada de “Síndrome da Covid Longa”. Um dos mais
intrigantes sintomas que, como os demais, podem ser transitórios ou duradouros,
é a síndrome da disfunção cognitiva.
Vale
ressaltar que, mesmo aqueles que apresentaram as formas brandas da virose, têm
relatado déficits de atenção, da função executiva (termo
abrangente para a gestão dos processos cognitivos, incluindo memória de
trabalho, raciocínio, flexibilidade de tarefas e resolução de problemas, bem
como o planejamento e execução), da linguagem, da velocidade de processamento e
da memória.
Estes
sintomas têm sido coletivamente referidos como "brain fog" (confusão
mental). A síndrome da disfunção cognitiva, juntamente com o aumento de
ansiedade, depressão e distúrbios do sono e fadiga, contribuem,
significativamente, para a morbidade da Covid Longa.
Curiosamente,
esta síndrome se assemelha com as alterações cognitivas encontradas em usuários
de quimioterapia para o tratamento do câncer, coloquialmente chamada de
"chemo fog". Os portadores das duas síndromes apresentam neuro-inflamação
e reatividade microglial da substância branca.
Todavia, na
prática cotidiana, o diagnóstico diferencial de confusão mental relacionada com
a Covid com outras patologias que cursam com sintomas semelhantes, não é fácil
do ponto de vista individual, porque informações neurocognitivas de pacientes
são raramente disponíveis.
Porém, do
ponto de vista populacional, tem sido documentado declínio cognitivo pós-Covid.
Geralmente os médicos relutam em aceitar uma condição clínica como doença
orgânica, sem um conceito fisiopatológico definido, ou sem a existência de
parâmetros de mensuração da doença em um determinado doente, como nos casos de
confusão mental pós-Covid, conforme elegantemente discutido em editorial do New
England J of Medicine (10.1056/NEJMcibr2210069).
Em
publicação recente no periódico Cell (DOI:10.1101/2022.01.07.475453), os
investigadores usaram um modelo animal (ratos) para testar investigar disfunção
cognitiva em sobreviventes de infecção respiratória leve, causada pelo novo
coronavírus. O estudo demonstrou que o SARS-Cov-2 pode promover alterações que
desregulam as células neurológicas cruciais para a função cognitiva normal.
Apesar de as
alterações neurológicas trazerem preocupação dado as similaridades com as que
ocorrem em doenças degenerativas humanas, estudos translacionais, como o
relatado acima, podem apontar caminhos para uma maior precisão diagnóstica e
terapêutica. Finalizo, citando o físico britânico Stephen Hawking: "As
grandes conquistas da humanidade foram obtidas conversando, e as grandes falhas
pela falta de diálogo".
* Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.
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