domingo, 19 de fevereiro de 2023

NOVA REALIDADE DA COVID-19


  

 

Antônio Carlos Sobral Sousa*

 

 

A estrada percorrida, desde o anuncio da Peste, até o momento atual, foi longa, sofrida e insegura. Sem mencionar, as “muitas pedras encontradas no meio deste caminho”, promovidas por uma legião de negacionista que incentivava a não adoção das medidas comprovadamente protetoras, como o uso de máscaras e as vacinas, se valendo das poderosas redes sociais, para disseminar suas Fake News, baseadas em relatos de pseudocientistas.

Por outro lado, a comunidade científica procurava entender o comportamento do ardiloso novo coronavírus, com o intuito de gerar subsídios para a escolha do melhor caminho de combate e de prevenção desse inimigo. A pandemia expôs a necessidade de o aprimoramento do pensamento médico, com treinamento adequado, para evitar heurísticas e vieses. O talento é imprescindível, mas não é suficiente. A carência de pensamento refinado prejudica o julgamento clínico do médico, implicando, consequentemente, em prejuízo na implementação das evidências científicas.

Apesar de os registros diários de pessoas infectadas pelo SARS-Cov-2 e dos eventuais incrementos na sua transmissibilidade, para muitos, a virose tornou-se um inconveniente transitório, que promove alguns dias de sintomas e um curto período de isolamento, o qual nem sempre é respeitado.

Para a maioria da população, a temida doença não assusta como outrora e as máscaras deixaram de ser vistas, mesmo em ambientes fechados, e é provável que também sejam peças raras até nos atuais bailes de carnaval. Segundo interessante reflexão, recém publicada no New England Journal of Medicine (DOI: 10.1056/NEJMp2213920), por professores da Universidade Columbia, Nova York, as referidas mudanças, alimentadas por prioridades econômicas e políticas, levaram à suposição geral de que a pandemia ficou para trás e já é hora de baixar a guarda e de retomar a vida pré-pandêmica.  

A realidade, todavia, contradiz a referida crença já que o impiedoso vírus ainda ceifa, aproximadamente, 50 vidas de brasileiros, diariamente. Além disso, muitos ainda apresentam complicações a curto e longo prazo da doença, sobretudo os portadores de comorbidades que prejudicam sua resposta imune às vacinas ou que os tornam especialmente vulneráveis às complicações da Covid-19.

Vale ressaltar, ainda, que a ameaça do surgimento de uma nova variante do vírus que eventualmente possa driblar as nossas defesas e a imunidade induzida pelas vacinas, não pode ser desconsiderada. Estes fatos sinalizam que ainda vamos ter que conviver com o intruso SARS-Cov-2 por um tempo imprevisível.

Os autores do citado artigo ressaltam que estamos navegando em condições mais complexas do ponto de vista social, econômico, político e clínico, além da necessidade de considerarmos as lições aprendidas até o momento, com o enfrentamento da virose. A politização da Covid-19, semeando desconfiança, proporcionando a disseminação de desinformações, causando divisão profunda da população na percepção da doença e na disposição de adotar as medidas protetoras, foi um lamentável erro.

É inegável que a cobertura vacinal e as medidas protetoras têm nos proporcionado uma situação bem mais confortável do que a do início da pandemia. Portanto, essa nova realidade nos obriga a evitar o uso de linguagem alarmista e oferecer soluções válidas e viáveis para trazer as pessoas para a nova fase não emergencial da pandemia.

Finalizo, citando Mohandas Karamchand Gandhi: “A força não provém da capacidade física. Provém de uma vontade indomável.

 

 

* Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.

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