domingo, 5 de março de 2023

NECESSIDADE DE MELHORAR A QUALIDADE ALIMENTAR DE PACIENTES COM INSUFICIÊNCIA CARDÍACA EM SERGIPE


  

 

Jamile Oliveira Costa*

Antônio Carlos Sobral Sousa**

 

 

A Insuficiência Cardíaca (IC) constitui uma síndrome clínica complexa, caracterizada pela incapacidade de o coração bombear sangue no volume necessário para atender às necessidades metabólicas do organismo, apresentando sintomas recorrentes que comprometem, significativamente, a qualidade de vida dos doentes e familiares próximos.

Apesar dos avanços terapêuticos, a sobrevida após o diagnóstico de IC, aumentou modestamente nas últimas décadas, ficando atrás de outras condições graves como o câncer, abrindo espaço, portanto, para novas estratégias de tratamento. A desnutrição é uma condição clínica negligenciada, que afeta parcela significativa de portadores da referida doença e esta associação pode decorrer, também, de dieta inadequada. Estima-se que a IC seja responsável por 21% das internações e por 10,8% das causas de morte por doença cardiovascular no Brasil.

Entre os principais fatores etiológicos da IC, destacam-se as síndromes coronarianas, a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), as valvopatias, as cardiopatias congênitas e as miocardiopatias (alcoólica, doença de Chagas, certas drogas oncológicas, doenças endócrinas e nutricionais, dentre outras).

As principais Diretrizes para o tratamento de IC, recomendam, além do uso dos medicamentos preconizados, a adoção de medidas de mudança do estilo de vida, tais como, abolir o uso de tabaco e de álcool, praticar exercícios físicos regulares, de acordo com a condição clínica do enfermo e ter uma dieta adequada.

O foco central da alimentação é evitar a ingestão excessiva de carboidrato simples, de gordura (saturada e trans) e de sódio, priorizando as fontes de carboidratos complexos e as gorduras inofensivas (mono e poli-insaturadas). Tais medidas visam aumentar a capacidade funcional e qualidade de vida do paciente.

Porém, de acordo com a Pesquisa de Orçamento Familiar (2017-2018) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), atualmente, a dieta da população brasileira apresenta alto teor calórico, maior consumo de carnes, de leite e de derivados ricos em gorduras, e baixo consumo de frutas, cereais, verdura e legumes.

Com o objetivo de identificar o padrão alimentar de pacientes internados com IC, tanto entre os usuários do SUS e como os da Rede Suplementar (RS) de saúde, a orientanda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal de Sergipe (PPGCS-UFS), Jamile Oliveira Costa, realizou a sua Tese de Doutorado, cujo produto foi recém-publicado no periódico Nutrients (DOI: 10.3390/nu14050987).

A investigação faz parte do Registro de Insuficiência Cardíaca (VICTIM-CHF) de Sergipe e constou de 240 voluntários hospitalizados em 03 unidades referência em cardiologia em Aracaju, sendo 67,5% assistidos pelo SUS. Foram identificados três padrões alimentares: o “Tradicional”, típico da população nordestina (feijão, arroz, massas, cuscuz de milho, raízes e tubérculos, ovos e farinha de mandioca somados a alimentos ultra processados como doces, sobremesas, lanches e embutidos); o “Mediterrâneo”, composto por alimentos ricos em nutrientes mais saudáveis como carboidrato complexo, vitaminas e minerais, gordura poli-insaturada e proteínas e rejeita o consumo de açúcar simples, dos refrigerantes e da gordura saturada.

Este padrão, semelhante à dieta Mediterrânea, é rico em elemento cardioprotetores e tem sido associado não apenas à diminuição na incidência de IC, como, também, nos seus desfechos indesejáveis; e o “Dual”, composto por alimentos de fácil preparo como os lanches, pães, doces e sobremesas, ricos em carboidrato simples, mas também em açúcares complexos e gorduras boas oriundas da sopa e azeite de oliva.

A adesão ao padrão “Tradicional” foi mais frequente entre os homens e os não diabéticos. Já o “Mediterrâneo” foi o mais consumido pelos idosos, os casados, os com menor renda e aqueles não portadores de HAS. Finalmente, o padrão alimentar “duplo” teve maior adesão pelos idosos, os que se autodeclararam não negros, os com maior renda, os atendidos no setor privado e os que apresentavam capacidade funcional menos prejudicada.  Todavia, independentemente da assistência de saúde utilizada, foi observada baixa adesão aos elementos cardioprotetores nas dietas utilizadas.

Portanto, o conhecimento do padrão alimentar da referida população, deixa patente a necessidade de implementação de estratégias de educação alimentar e nutricional que incentivem a adoção de ingredientes mais saudáveis, semelhante aos encontrados na dieta do Mediterrâneo, com elementos potencialmente protetores dos agravos e limitações na qualidade de vida que a IC pode causar.

 

 

* Nutricionista e participante do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal de Sergipe (PPGCS-UFS).

** Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação,

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