domingo, 16 de julho de 2023

ASPECTOS DA EDUCAÇÃO SERGIPANA E DORENSE NO SÉCULO XIX


  

 

José Lima Santana*

 

 

Em 1856, sendo Aracaju capital há apenas um ano, a cidade era sofrível. Nem casas decentes para alugar eram encontradas. Depois, os preços dos alugueis eram exorbitantes. Fazia-se preciso uma casa “agasalhada e decente”, para servir de escola. Havia poucas casas na novel capital.

Em Relatório daquele ano, o Inspetor Geral das Aulas, após descrever as escolas existentes na capital e nas vilas, disse sobre as escolas dos povoados: “Continuando a indigitar os diversos pontos da Província onde existem aulas, tenho a dizer que Itabaianinha, Santo Amaro, Porto da Folha, Espírito Santo, Campos, Simão Dias, Campo do Brito, Pacatuba, Gerú, Japaratuba, Pintos, Chapada, Riachão, Lagoa Vermelha, Santa Rosa, Enforcados, Brejo Grande, Porto Grande, Parida, e Barra dos Coqueiros, contam com uma aula de instrução primaria para o sexo masculino”.

A maior parte desses povoados seria, mais tarde, elevada à categoria de vila e, adiante, de cidade. Enforcados, antigo nome de Nossa Senhora das Dores, desde, pelo menos, 1606, como os demais povoados, continuava com uma única escola. O governo provincial ressentia-se da falta de colaboração das Câmaras Municipais, no que dizia respeito à construção de casas para o funcionamento das escolas, como asseverou o Relatório acima referido: “As Câmaras Municipais bem poderiam ajudar a falência dos dinheiros provinciais, concorrendo com uma determinada soma para a edificação d’essas casas, prestando d’esta sorte grande benefícios aos seus munícipes. A aula de primeiras letras do sexo feminino da cidade de Laranjeiras, regida por Posidônia Maria de Santa Cruz Bragança, é aula, que pode servir de exemplo; a casa em que leciona foi feita pelo Sr. Dr. Bragança apropriada para o ensino; círculos de ferro formam as classes que requer o método de ensino simultâneo, a sala do ensino além de estar completa de material, existe na maior ordem possível, e a professora com esmero cumpre os deveres de seu cargo apresentando o melhor resultado”.

A escola feminina de Laranjeiras foi a primeira construção edificada na Província para tal fim. Não achamos notícias sobre outra similar. Mas, foi construída pela família da professora, e não pelo poder público. Se a penúria dos cofres provinciais era sentida, imagine-se a dos cofres municipais, ou a desatenção das Municipalidades para com um serviço que se entendia ser de responsabilidade da Província, e não dos Municípios.

A escola do sexo feminino de Nossa Senhora das Dores foi criada provisoriamente em 23 de abril de 1857, pelo 3º vice-presidente da Província José da Trindade Prado, que nomeou para regê-la “D. Elena Andrade Cardoso, que deu provas de suas habilitações no exame que respondeu”. Essa cadeira foi, depois, confirmada por força do art. 4º da Lei 490, de 21 de abril de 1858. O Mapa B anexo ao Relatório do presidente Cunha Galvão, de 27 de abril de 1859, registrava a criação da referida escola como sendo a 23 de abril de 1857, data da criação provisória. E o nome da professora aparece grafado como D. Helena d’Andrade Cardoso. No fim de 1858, a escola contava com uma matrícula de 16 alunas.

Na mesma data, a escola dorense do sexo masculino, criada em 5 de março de 1835, e regida, em 1858, pelo professor Hermógenes Nunes Cajá, tendo este sido provido em 11 de julho de 1853, contava com 103 alunos matriculados. Essa diferença tão acentuada nas matrículas de ambos os sexos podia evidenciar algumas situações: a) a escola das meninas era nova, carecendo, pois, afirmar-se; b) as famílias ainda se mantinham ciosas de mandar suas filhas para as aulas, sob a direção de uma professora que não pertencia à comunidade local, da qual ainda não se sabia o quanto era “mulher honesta”, como exigia a legislação da época.

Em 1858, a Província já contava com “95 aulas públicas”. Destas, eram “51 escolas de primeiras letras para o sexo masculino, 22 ditas do sexo feminino, e 22 aulas de instrução superior”, conforme Relatório apresentado pelo presidente João Dabney D’Avellar Brotero à Assembleia Legislativa Provincial, em 1858, p. 33.

Além da capital, as demais cidades, em número de apenas quatro, e algumas vilas, mantinham mais de uma escola, às vezes três ou quatro. Duas escolas, uma para meninos e outra para meninas estavam localizadas nas vilas de Divina Pastora, Villa Nova, Itaporanga, Santa Luiza e Itabaianinha, nas Freguesias do Socorro, Pé do Banco, Nossa Senhora das Dores e no povoado da Barra dos Coqueiros.

As duas escolas existentes em Nossa Senhora das Dores, sendo uma para cada sexo, já não eram suficientes. A povoação de Nossa Senhora das Dores crescia e progredia de forma acentuada. Daí a criação da Freguesia, em 1858, e da Vila, em 1859. O governo provincial já vinha atento para o fato de “que a criação de aulas para um local, quando esse local requer o ensino para seus filhos” deveria levar em conta quer o “crescido número de habitantes”, quer o “movimento rápido e progressivo com que caminha no andar do tempo para seu engrandecimento”. Era o caso de Nossa Senhora das Dores.

Dois meses antes de sua elevação à categoria de vila, que se deu em 11 de junho de 1859, as escolas existentes não bastavam para atender as demandas, especialmente dos meninos, a exemplo do que ocorria em outras localidades da Província, como reconhecia o governo: “Finalmente em outros muitos, não satisfaz a necessidade do ensino uma só aula pela grande frequência e afluência de alunos, bem como a da cidade de Maruim, a Villa de Propriá, e Freguesia de Nossa Senhora das Dores”, de acordo com o Relatório da Instrução Pública, anexo ao Relatório apresentado à Assembleia Legislativa Provincial pelo presidente Manoel da Cunha Galvão, em 27 de abril de 1859, p. 3.

No ano em que Nossa Senhora das Dores foi elevada à categoria de Vila, o governo provincial reconhecia a necessidade de ser implantada mais uma escola para o sexo masculino, dada a “grande frequência e afluência de alunos”, na forma do Relatório do Inspetor Geral das Aulas, anexo ao Relatório acima citado, p. 3.

 

 

*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras, da Academia Sergipana de Letras Jurídicas, da Academia Sergipana de Educação e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.

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