José Lima Santana*
Em 1798, Sergipe contava com apenas
duas cadeiras de ler e escrever, situadas em São Cristóvão e Santa Luzia. Em
1828, existiam 24 cadeiras públicas. Em 1834, eram 29 cadeiras de primeiras
letras, sendo 25 de meninos e 04 de meninas, como nos diz Maria Thetis Nunes
(História da Educação em Sergipe, 1984, p. 29, 46 e 55).
Em 1835, quando passaram a funcionar
as Assembleias Legislativas Provinciais, na Província de Sergipe, a educação
pública primária ainda era muito restrita. Do mesmo modo, restritas também eram
as vilas, muitas delas assentadas em lugarejos de difícil acesso e precária
comunicação em relação à velha capital, São Cristóvão, única cidade existente
em Sergipe, quando da independência brasileira, em 1822. Os povoados
espalhavam-se, ainda mais distantes e ainda mais pobres do que as vilas.
A partir de 1820, grandes, sem
dúvida, foram as dificuldades financeiras da Província, que se arrastava
penosamente na vida político-administrativa. A antiga sujeição à Bahia, ainda
lhe pesava. A falta de uma estrutura administrativa eficaz nas primeiras
décadas após a separação em relação à Província vizinha, não lhe permitia fazer
significativos progressos em vários setores da vida pública, como era o caso da
prestação de serviços públicos, e, mais de perto, da educação pública primária,
embora, antes mesmo de 1835, as despesas imperiais com a instrução pública em
Sergipe apresentavam-se maiores do que em algumas outras Províncias.
Minguados eram os recursos
financeiros da pequena Província. Para piorar a situação das finanças públicas
sergipanas, o descalabro parecia ter-se instalado na Inspetoria do Tesouro da
Província, em 1835, quando o inspetor da referida Repartição foi acusado pelo
presidente da Província, Manoel Ribeiro da Silva Lisboa de ter efetuado “saques
sobre diversas quantias dos fundos d’esta Província arrecadados na Bahia, todos
prejudiciais à Fazenda Pública, e classificados pelo Conselheiro Procurador
Fiscal do Tesouro [...] em espécie de peculato, e sem precederem as necessárias
fianças contra as disposições de todas as leis em vigor, como se vê das copias
juntas, e até sem submeter, como lhe cumpria, ao conhecimento e aprovação deste
Governo os que fizera a favor dos remitentes Luiz Barboza Madureira e David
Antônio e Companhia; tendo na devida consideração o que me incumbe o meu
Regimento, e dispõem o artigo 156 do Código Penal, ordeno a v. m. passe a fazer
efetiva a responsabilidade ao sobredito Inspetor, que por isso se acha suspenso
do exercício de suas funções, procedendo contra ele pelo que dito fica na forma
da atual Legislação, e instruindo o processo respectivo com o corpo de delito,
que fará basear na presente ordem, e mais papeis, que a acompanham” (Relatório
de Todos os Atos do Governo da Província de Sergipe. Bahia, Typ. Do Correio
Mercantil, de Précourt e Co., 1835, p. 36).
Pelo exposto, pode-se depreender que
as dificuldades financeiras da Província se agravavam ainda mais em face do
descalabro administrativo, embora tenha-se aqui um fato isolado, porém,
representativo. O que isso tinha a ver com a escola pública primária? Em
princípio, nada de aparente. Mas, no fundo, a falta de recursos financeiros
atingia toda a gestão pública. E exatamente a partir daquele ano, ou seja,
1835, as Províncias já tinham as suas respectivas Assembleias Legislativas
instaladas, para legislar, inclusive, sobre o processo educacional, e a gestão
escolar era própria, em cada Província, e não mais imperial. A gestão pública
não podia se desprender das finanças públicas. Sem estas, de forma satisfatória,
aquela se tornava ainda mais difícil de ser empreendida a contento e em todos
os seus setores.
Naquela época, as escolas públicas
primárias pertenciam ao governo provincial. Não havia, ainda, escolas
municipais. Em Sergipe, estas somente apareceriam a contento na era
republicana. O século XIX foi, em termos de administração pública, o século das
Províncias, em detrimento dos Municípios. Aquelas não tinham autonomia
administrativa plena em relação ao governo imperial. E estes, ou seja, os
Municípios, não tinham como manter autonomia em relação às Províncias, posto
que as finanças municipais eram, destarte, insignificantes. Sem finanças, não
havia falar em autonomia municipal para valer. Além disso, havia de considerar
que o Ato Adicional nº 1, de 1834, garroteou a autonomia municipal, ao retirar
da Câmara de Vereadores o poder de continuar editando as posturas municipais,
que, doravante, passariam a ser votadas pela recém-criada Assembleia
Legislativa Provincial mediante propostas advindas das próprias Câmaras.
*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras, da Academia Sergipana de Letras Jurídicas, da Academia Sergipana de Educação e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.
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