José Lima Santana*
Os ateus
dizem que os homens, com medo da morte e do não vir a ser, inventaram Deus como
válvula de escape. Os crentes dos mais diversos credos religiosos acreditam, em
maioria acentuada, na vida após a morte. As religiões foram sendo criadas ao
longo dos milênios, desde os primórdios da humanidade. Logo cedo, os seres
humanos deixaram-se tocar pela mística e pelos mistérios das divindades.
As
religiões monoteístas – judaísmo, cristianismo e islamismo – arrebanham bilhões
de fiéis. No caso específico do cristianismo, em suas diversas vertentes, e que
são muitas, a fé na ressurreição de Cristo é o seu grande sustentáculo. “O
Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14). Especificamente, para o
catolicismo, a fé deve ser sustentada pela Palavra, Tradição Apostólica e
Magistério da Igreja.
Não há
religião que não tenha suas instituições e autoridades religiosas. Umas mais,
outras menos. Se as divisões entre os cristãos geraram guerras, disputas,
incompreensões e intolerâncias, é de observar-se que no interior da própria
Igreja Católica, ao longo de vinte e um séculos, muitas têm sido as discussões
que levaram e levam a díspares compreensões, a acirradas disputas, a graves
momentos de queda de alguns de seus membros e de elevação de tantos outros.
“Tu és pedra...”,
disse Jesus a Simão Barjonas. Pedro. Pedra. O que falta, hoje, aos membros da
Igreja Católica, mormente ao seu clero? Falta a busca de unidade na
diversidade? Falta, da parte de alguns, a tão necessária humildade que deveria
ser própria de todos os cristãos, católicos ou não, clérigos ou não? “O Filho
do Homem não veio para ser servido, mas para servir...” (Mt 20,28). Jesus o
disse.
Vez por
outra, escândalos aparecem na superfície da Igreja que, como um grande navio,
arrasta abaixo da linha d’água um casco com os mais variados problemas. Padres
e bispos têm caído em suas próprias redes. Isso faz a Igreja, como instituição,
pagar pela culpa de alguns de seus membros. Quando um escândalo vem à tona, não
é apenas o seu causador que é posto na berlinda. É a Igreja, que, afinal, deve
ser purificada com o banimento daqueles que a enxovalham na surdina, até que
seus desvios sejam expostos.
As
religiões seriam mesmo o ópio do povo, como declararam os marxistas? Até podia
ser. Tempo houve em que se dizia e se pichavam nos muros: “Os fracos rezam; os
fortes lutam”. Houve, porém, quem acrescentasse: “Os fracos rezam; os fortes
lutam; mas os sábios rezam e lutam”. As religiões não são o ópio do povo. O
ópio do povo é a fé escurecida pelos desvios devocionais e/ou comportamentais.
Em quaisquer religiões.
Nalguns
casos, elegem-se líderes religiosos como novos “messias” (com letras
minúsculas). Fiéis deixam-se seduzir ou iludir por teologias imediatistas. Falo
do interior da Igreja Católica, que é a minha Igreja. Não me interessa, aqui,
voltar-me para outros segmentos religiosos, cristãos ou não. Cada um cuide de
si.
Noutros
casos, desvios de conduta de uns tantos líderes religiosos, sob os mais
variados tipos de desvios, açulam o descrédito de muitos fiéis, desmoralizam as
instituições e depõem contra a instituição maior, a própria Igreja, no seu todo
considerada. O escândalo causado por um líder religioso não apenas o afeta, mas
também a Paróquia, o Santuário, a Diocese e a dimensão geral, que vem a ser a
Igreja Católica, espalhada por todo o mundo.
É difícil
aceitar os escândalos, jogá-los debaixo do tapete. Escândalos são males que
devem ser extirpados, tumores cancerosos a ser arrancados com bisturi e sem
anestesia. Na crueza mesmo. Para salvaguardar a Igreja, deve-se expelir a
parte, para não macular o todo.
Na Igreja
Católica, os líderes religiosos (diáconos, presbíteros e bispos) devem ser
varões probos, em tudo provados. Os presbíteros em sua ordenação fazem votos de
obediência e castidade. Os religiosos acrescentam o voto de pobreza. Um voto
feito é para ser cumprido. Quem assim não o faz, trai o voto, não se tornando
digno do seu ministério. Por aí espalham-se os chamados “telhados de vidro”. E
“telhados de vidro” voltam-se, por vezes, contra outros “telhados de vidro”.
Luta intestina. Via de regra, por interesses contrariados. Há, decerto,
“telhados de vidro” mais frágeis do que outros. Todavia, todo “telhado de
vidro” não deixa de ter suas fragilidades, que, um dia, poderão ser expostas.
Se não hoje, quem sabe, amanhã?
Por conta
dos mais diversos desvios, sucedem-se os escândalos: financeiros, morais etc.
Hoje aqui, amanhã ali. “Tu és pedra e sobre esta pedra erguerei a minha Igreja”
(Mt 16,18). Um dia, espera-se, todos deverão compreender estas palavras de
Jesus Cristo. A Igreja, hoje, está sobre os ombros de todos. Todos devem se
sentir Pedro, mas cada um com a função que lhe compete, canonicamente. Nem
mais, nem menos.
O Papa
Francisco tem sido incansável no combate aos abusos praticados no interior da
Igreja. Oxalá ainda dure o seu pontificado. Que Deus o fortaleça para continuar
enfrentando os múltiplos desafios.
Por fim,
aguarda-se o que está por vir, a partir do próximo Sínodo dos Bispos. Novos
ares soprando sobre a Igreja, para o gáudio de alguns e para a contrariedade de
outros, estes os ultraconservadores empedernidos. Estamos à vista do maior
processo de consulta democrática da história da Igreja Católica. Que venha o
Sínodo. E que a Luz vença o que ainda restar de trevas.
*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras, da Academia Dorense de Letras, Academia Sergipana de Letras Jurídicas, Academia Sergipana de Educação e Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.