segunda-feira, 29 de agosto de 2022

AS DUAS CARTAS


  

 

José Lima Santana*

 

 

A Carta pela democracia divulgada no dia 11 deste mês, celebrando a Carta aos Brasileiros da lavra do eminente e saudoso professor Gofredo da Silva Telles Júnior e, também, propugnando pelo respeito à democracia e contra, portanto, qualquer movimentação interna em favor de golpe contra o estado democrático de direito, mereceu a assinatura de pessoas de vários segmentos sociais, econômicos e políticos. Eu fui um dos seus signatários e serei de tantos quantos documentos se levantem contra qualquer ensejo espúrio para atentar contra a normalidade democrática.

Um candidato a governador de outro Estado, da direita, numa sabatina, levantou uma questão deveras interessante, mas, que, não justifica sua reação contra a referida carta: pessoas ligadas à esquerda, disse o candidato, assinaram a carta, mas defendem ditaduras como as da Nicarágua, Venezuela e Cuba.

Êpa! Eis um problema a merecer a minha atenção. Não sei a dos leitores. Realmente, em parte, ele pode ter mesmo razão. Afinal, quem se levanta contra a tentativa de articulação de golpes que miram implantar ditaduras, deve ter a hombridade de ser contra quaisquer ditaduras, e não há, no meu entender, pretextos que possam justificar uma ditadura, seja de direita ou de esquerda. Eu as abomino. Levantarei a minha voz, miúda, bem sei, contra qualquer tipo de ditadura, aqui, no nosso País, ou alhures. As ditaduras comunistas, fascistas ou outras quaisquer sempre mereceram o meu repúdio. E merecerão.

Um professor aracajuano levantou e publicou num grupo de Whatsapp a quantidade de ditaduras pelo mundo afora. É uma realidade terrível, a ser verdadeira. E deve ser: 18 ditaduras na África Subsaariana, 12 no Oriente Médio e Norte da África, 8 na Ásia-Pacífico, 7 na Eurásia, 3 nas Américas e apenas 1 na Europa. Total de 49 ditaduras. Tristíssima constatação. Ainda perambulam por aí esse tipo nefasto de regime político. Ditaduras são abjetas. São repugnáveis. Aqui ou acolá. Repito: de direita ou de esquerda.

Em 1977, a Carta do professor Gofredo “despertou grande interesse no Brasil inteiro e foi traduzida para as principais línguas estrangeiras, alcançando as primeiras páginas dos grandes jornais do mundo. Expôs, dentro de princípios científicos, a legitimidade das leis e Constituições, do Poder e da Ordem, os quais geram a democracia verdadeira, propulsora única do desenvolvimento econômico e da segurança nacional. Fez um paralelo entre o Estado de Direito e o Estado de Fato e relaciona, a seguir, os direitos protegidos pelo Estado de Direito, como valores soberanos que inspiram as ordenações jurídicas de nações verdadeiramente civilizadas”.

Concluiu, exigindo o imediato Estado de Direito para o Brasil, ficando célebre a frase final: “O Estado de Direito, já”! A coragem do mestre Gofredo mereceu até o fim de sua longa vida os aplausos de seus alunos e de todos os alunos da Faculdade de Direito da USP, no célebre Largo de São Francisco. A cada 11 de agosto, os estudantes de Direito da USP dirigiam-se à Av. São Luís, no centro de São Paulo, onde morava o mestre, para homenageá-lo. Enquanto pôde, já aposentado, ele descia e discursava brevemente. Cheguei, uma vez, emocionado, a presenciar o ato, pois o hotel que eu me acostumei a ter como local de hospedagem, em Sampa, era vizinho ao prédio onde o professor Gofredo morava. Quando não mais podia descer, ele acenava para os estudantes, que iam embora, louvando o grande mestre, autor da Teoria Quântica do Direito.

A Carta do mestre paulista foi enfática: “O Governo com o senso grave da ordem é um Governo cheio de Poder. Sua legitimidade reside no prestígio popular de quase todos os seus projetos. Sua autoridade se apoia no consenso da maioria. Nisto é que está a razão da obediência voluntária do Povo aos Governos legítimos. Denunciamos como ilegítimo todo Governo fundado na Força. Legítimo somente o é o Governo que for Órgão do Poder. Ilegítimo é o Governo cheio de Força e vazio de Poder. A nós nos repugna a teoria de que o Poder não é mais do que a Força. Para nossa consciência jurídica, o Poder é produto do consenso popular e a Força um mero instrumento do Governo”.

Na nova Carta da quinta-feira (11), juristas e professores da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) leram no Largo de São Francisco um manifesto em defesa da democracia e do sistema eleitoral brasileiro.

O novo texto denuncia que o Brasil enfrenta “um momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições” e faz uma crítica aos “ataques infundados e desacompanhados de provas” que questionam o resultado das eleições.

O parágrafo final da carta atual faz menção ao documento que lhe serviu de base e resgata a importância da conquista de eleições livres e periódicas. “Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros do professor Gofredo Teles, e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos às brasileiras e aos brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições”.

Quarenta e cinco anos depois, a nova Carta segue os passos da Carta de 1977: a luta pela normalidade democrática deve continuar. Sempre. Sempre. Sempre. Este é o direito e o dever dos cidadãos e das cidadãs, que renegam as ditaduras, quaisquer que sejam elas. De direita ou de esquerda. É como penso. É o que defendo.

 

 

*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras, da Academia Dorense de Letras, da Academia Sergipana de Letras Jurídicas, da Academia Sergipana de Educação e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.

terça-feira, 23 de agosto de 2022

A UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE NA VANGUARDA


  

Antônio Carlos Sobral Sousa*

 

 

Recordo do meu orgulho, em 1976, ao transpor os umbrais da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS), na aurora de uma nova vida, sob as auras da crença e o eflúvio das puras esperanças, seguindo a trilha de gerações que vêm consagrando a perpetuidade da nossa cultura na formação dos hodiernos discípulos de Hipócrates.

Orgulho ainda maior eu senti, quando passei a integrar o corpo docente da referida Universidade, tanto no Departamento de Medicina, como no prestigiado Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde. Vale ressaltar que, uma das tarefas mais gratificantes do professor universitário, é a de também contribuir para a formação de mão de obra que possa dar continuidade à missão de ensinar a futuras gerações, a arte de ser guardião do bem mais precioso da humanidade: a vida.

A UFS mais uma vez volta a ser motivo de orgulho, não somente para mim, como para todos os sergipanos, ao ser destacada, nacionalmente, pelas relevantes atividades científicas e de ensino. Segundo o World University Rankings 2022, publicado pela revista inglesa Times Higher Education (THE), a UFS foi classificada entre as três melhores do Brasil, ao lado das Universidades Federais de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, ficando atrás apenas da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

Na referida classificação, a UFS se destaca como a melhor universidade do Nordeste e, globalmente, entre as 1.662 instituições escrutinadas, de 99 países, se encontra na faixa que vai de 601 a 800, entre as mais conceituadas universidades do mundo. A Universidade de Oxford, na Inglaterra, ocupa o topo da lista, pelo sexto ano consecutivo.

O ranking é baseado em 13 indicadores que mensuram o desempenho das entidades referentes a quatro esferas: ensino, pesquisa, citações científicas e reconhecimento internacional. Segundo relato do Prof. Lucindo Quintas, docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde (PPGCS) da UFS, o elemento que mais impactou na avaliação da UFS foi o critério “citações científicas”, demonstração inequívoca da qualidade de nossas pesquisas e do amadurecimento dos nossos pesquisadores.

As citações refletem aspectos cognitivos ou epistemológicos e sociais da prática acadêmica que tem como produto primário textos que citam outros textos. Este caráter recursivo das operações que envolvem as citações faz com que seja constituída uma rede de difusão de pesquisas e, consequentemente, dos seus locais de produção. É importante frisar que essa rede de citações possui certa arquitetura, capaz de revelar alguns padrões e características de um determinado grupo de pesquisa.

Na esteira desta interlocução, vale ressaltar a valiosa e intensa produção científica dos pesquisadores da UFS, notadamente os pertencentes ao PPGCS por ocasião da pandemia da Covid-19. A despeito dos baixos investimentos e de condições muitas vezes desfavoráveis, as produções oriundas do referido grupo de cientistas têm contribuído para o enfrentamento desta enigmática virose e para a respeitada projeção internacional da nossa querida UFS.  

Finalizo citando o médico francês René Dumesnil: “A tarefa do médico não é somente a de defender a vida contra a morte, mas reanimar os que esquecem o respeito e o próprio sentido da vida. É preciso que ele se mantenha digno dessa tarefa cuja nobreza e desinteresse o colocam acima dos outros homens”.

 

 

* Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.

domingo, 21 de agosto de 2022

PINTADO DE CHICO DE ZÉ MIGUÉ


  

 

José Lima Santana*

 

 

Pintado de Chico de Zé Migué nunca usou uma arma, a não ser a faca luminosa de retalhar e cortar carne de sol, na salgadeira e nas feiras semanais de Floresta, no sábado, e de Panelas, no domingo. Pacato, bom amigo, jamais se metera em encrencas de qualquer ordem.

Aos vinte e cinco anos, esperava desposar Ana Alice de Joãozinho da manteiga, moça prendada e de bons estudos. O namoro já durava dois anos e meio. Pintado tinha umas poucas sardas no rosto, daí o apelido que lhe fora posto pelo próprio pai, nos primeiros dias após o nascimento.

O pai, Chico de Zé Migué, era um pequeno proprietário de terras nas quais cultivava algodão e criava pouco, mas bom gado de corte. E Zé Migué, o avô, ainda vivo, já passara dos oitenta anos, porém fornido como um tronco de baraúna. Família respeitada pelo que era, e não pelo que tinha, como outras famílias dali, de Floresta, na boca do sertão, cidade que crescia a olhos vistos, já se ombreando com Panelas, da qual se separara há cinquenta e dois anos.

Aproximavam-se as festas de fim de ano. Natal e Ano Novo. Em Panelas, o Natal tinha encenação do nascimento de Cristo, missa cantada em latim e feirinha na Praça da Matriz, que fazia o maior sucesso em toda a região. Nas festas natalinas dançavam o pastoril, o cacumbi e o reisado. Ainda contavam com as apresentações de grupos de pífanos e zabumbas.

Festança a não ter igual em redor de dez a quinze léguas. Panelas e Floresta distavam pouco mais de duas léguas, uma da outra. O Natal em Floresta não era sequer a sombra do de Panelas. As comemorações reduziam-se às ceias caseiras. Não tinha nem a missa do galo, pois o padre que atendia Floresta era o de Panelas. Nem feirinha, nem danças. Todavia, a festa de Ano Novo, que ali se chamava Ano Bom, começava a ameaçar a de Panelas. Crescia com a cidade.

Uma rodovia federal estava sendo implantada, passando nas cercanias de Floresta. Progresso. O prefeito de Panelas apelou para um deputado federal, seu compadre, para que a rodovia fosse deslocada. Em vão. Um empresário da capital adiantou-se e construiu em Floresta um supermercado e um posto de gasolina, novidades na cidade. Logo mais, o movimento de caminhões e carros levaria muita gente à procura de mantimentos e serviços.

Pintado de Chico de Zé Migué, atento ao que ocorria, abriu um açougue em Floresta, o primeiro da cidade. Nem Panelas desfrutava de um açougue, que vendesse carnes e produtos afins, como aquele. O rapaz mostrava que tinha faro para os negócios. Em seis meses, já ampliava o espaço do açougue. O que lhe faltava? O casamento. Um sonho a realizar-se em breve.

Ana Alice preparava-se para o enlace. Ela mesma, prendada, bordava as principais peças do enxoval de noiva. Sua tia, Rosália de Marina, ajudava nos arremates e noutros bordados de menor monta. Tudo convergia para os meados do ano vindouro. A mãe de Ana Alice queria que o noivado se desse em dezembro e o casório em maio. Mas, a moça pretendia noivar em janeiro, no dia do seu aniversário, a 19, e o casamento, sim, em maio. Em questão de datas, Pintado de Chico de Zé Migué, cuja graça de batismo era Júlio César, não opinava. “Qualquer data pra mim tá de bom tamanho. O que eu quero é casar com a minha flor”, dizia.

O ano foi findando. Novembro estava nos seus estertores. Era uma tarde de terça-feira, última do mês, dia em que Júlio César bandeava-se para Trincheiras, cidade de maior porte do que Floresta e Panelas, para aviar algumas compras, a fim de bem sortir o açougue.

Compras feitas, no dia seguinte, perto do meio-dia, Pintado foi esfriar a goela com uma cerveja no bar de Amarildo de Zé Migué, seu tio, ali arranchado há mais de vinte anos e em cuja casa ele tinha pernoitado. Mal chegou ao bar, sua tia de cortesia, Cida de Amarildo, chamou-o a um canto da casa, encostada ao bar. Estava meio esbaforida. Olhos arregalados, a mulher, em voz de sussurro, mão direita espalmada à altura do peito, soltou uma bomba: “Meu filho, aconteceu um alvoroço da desgraça. A notícia chegou aqui, há instantinho, através de Zeca sapateiro, amigo de seu pai. O que se diz é que Ana Alice, sua namorada, fugiu ontem à noite com o padre Afrânio Borba, de Panelas. O diabo anda fazendo festa por aquelas bandas desde que aquele padre de lambreta chegou por lá”. Pintado de Chico de Zé Migué não queria acreditar no que acabara de ouvir. “Que história é essa, tia”? A tia ergueu os braços e disse: “Pois é. Um desastre. Um desmantelo de vida, meu filho. Eu ouvi Zeca dando com a língua nos dentes ao seu tio. Eu ouvi a conversa dos dois por trás da porta de ligação entre o bar e a casa”.

Pintado empalideceu. Ana Alice? Com o padre? Como? Estaria desmilinguida do quengo? Ele nunca teve motivo para duvidar do bem-querer dela. Nunca soube de qualquer conversa dela com o padre, nem lá por trás das nuvens. “Minha tia, a senhora tem certeza”? Sim, ela tinha. “Júlio César, meu amor, você já ouviu dizer que Zeca sapateiro seja homem de conversa sem fiança”?

Não uma, mas duas, três ou muitas outras cervejas, para afogar a mágoa, o desengano? Não. Pintado era um rapaz sóbrio, ponderado. Tomou o rumo do jeep de sua propriedade, estacionado debaixo de uma mangueira em flor. Rumou de volta para Floresta. Agoniado? Decerto.

A poeira da estrada cobria o jeep e o motorista. As compras feitas ficaram em Trincheiras. A fuga de Ana Alice com o padreco era a ordem do dia. Caía a tarde quando Pintado chegou em casa. “Mãe, que conversa é essa, que tia Cida me contou, do fugimento de Ana Alice com o padrezinho de Panelas”? A mãe não entendeu nada. “Fugiu? Quem fugiu, meu filho? Que eu saiba, por aqui, ninguém fugiu”.

Notícia sem nexo, aquela que Cida de Amarildo deu ao sobrinho. Na verdade, o que Zeca sapateiro informou a Amarildo foi que houve um bate-boca, que acabou em tiroteio, sem vítimas, graças a Deus, nas proximidades da igreja de Floresta. Ana Alice tinha ido à missa. Ela, o padre e algumas beatas fugiram do tiroteio, escondendo-se na casa de Zeca sapateiro, situada bem em frente à igreja. Aquela foi a fuga. O resto foi fake.

 

 

*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras, da Academia Dorense de Letras, da Academia Sergipana de Letras Jurídicas, da Academia Sergipana de Educação e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.

domingo, 14 de agosto de 2022

PARA ONDE CAMINHA O BRASIL


 

 

José Lima Santana*

 

 

Para onde caminha o Brasil diante das questões políticas em pauta, especialmente em face das próximas eleições? Há um cipoal jurídico, social e político a envolver o mundo da política e o povo, que se divide entre A e B, quando, para alguns, A e B, nem mereciam estar onde se encontram, em termos de pesquisas eleitorais, vendo-se as posições de ambos, respeitando-se os seus direitos civis e políticos, bem assim, respeitando-se os movimentos, nem sempre democráticos, de seus apaniguados, de lado a lado, uns mais aguerridos do que outros, mas, todos mitificando ou divinizando os seus líderes. Algo assustador para uma democracia.

Como cidadão, tenho minhas opiniões, que, às vezes, são questionadas pelos seguidores de A ou de B. Para isso, estou pouco me lixando. Digo ou escrevo o que penso, sem pretender agradar ou não.

Diante de tantas diatribes com as quais se tenta intimidar o processo eleitoral, representado por suas autoridades judiciais e pelos mecanismos usados para a recolha dos votos e consequente apuração, há quem queira se arvorar em paladinos da segurança das urnas eletrônicas.

Paladinos... Puxa vida! Tantos anos depois do início do uso das urnas eletrônicas, elas, agora, são inseguras e passíveis de fraudes? Todas as eleições anteriores, inclusive, a última, foram fraudadas? Quem sabe, hein? Ora, senhores paladinos de meia tigela, façam-me o favor! Ponham-se em seus lugares.

Por outro lado, as autoridades judiciais eleitorais têm escorregado em falas e ações, como a que convidou certas pessoas ou instituições para o debate interno sem nenhuma necessidade. Um tiro no pé, cujas consequências se arrastam. Nem todos os convidados deveriam ter sido convidados. Fica uma descabida troca de ofícios, um disse-me-disse, farpas daqui e dali, e tudo isso alimentando um clima de ameaças. Absurdo. Ridículo.

Ainda se fala e se esparrama por aí, em alto e bom som, como o berro de um bezerro desmamado, que o certo é ter o voto impresso. Não se deveria mais falar nisso. Não para a próxima eleição. Por quê? Porque o TSE não quer? Porque um lado metido no processo eleitoral não quer? Não. Deixe-se de conversa mole para boi dormir.

Não se deveria mais falar nisso porque o Congresso Nacional, recusando o debate sobre o tema, sepultou o assunto para sempre, ao menos no tocante às eleições de outubro próximo. Pronto. Acabou. O Congresso Nacional disse “NÃO”, contrariando quem quer que seja. Fim do jogo no segundo tempo. Ao menos do jogo jogado de forma legal. Constitucional.

O mais é querer colocar o País no olho do furacão do golpe ou da contenda civil. Golpe? No mínimo, tem-se ensaiado, repetidas vezes, ameaças de golpe. Ensaios, desejos... Daí quem sabe, partir para tentativas práticas, mais adiante. Será? Tentarão? Tudo é possível. Porém, o que se espera é que tudo isso não passe de bravatas de alguns. Que as descabidas manifestações em favor de Donald Trump, após sua derrota na tentativa de reeleição, não se repitam por aqui, caso o atual presidente não consiga se reeleger. Ganhar ou perder faz parte do jogo político. Para ele ou para os outros.

No exato momento em que as urnas venham a falar, para A ou para B, que a vontade popular seja respeitada, como deveras deve ser. Ponto final. 1964 não deve repetir-se em 2022. Chega! Que os quarteis portem-se como quarteis para ser respeitados como quarteis.

Alguém, no estrangeiro, cujo nome, desculpem os leitores, não me ocorre, já disse: “Soldado, tu não és a cabeça da Pátria. Tu és o braço da Pátria”. Braço forte. Mas, braço. Indispensável à segurança externa do País. Das questões internas, que digam respeito à condução política, hão de cuidar os civis, com respeito e dignidade. Com destemor cívico. Enfim, cada um no seu chão, o militar e o civil. Todos, enfim, “filhos desta mãe gentil”. E filhos são filhos, sem tirar nem pôr. Igualmente filhos.

A campanha política deste ano, a julgar pelas preliminares, do lado A e do lado B (sem falar em outros lados), poderá ser vexatória. Que a Justiça Eleitoral esteja atenta para agir com o devido rigor da lei, impedindo que a campanha seja enxovalhada por acusações ásperas e antijurídicas. Que os candidatos em geral ponham-se a apresentar propostas factíveis (o que nem sempre ocorre), usem dos meios legais para convencer o eleitorado e que vença quem o povo assim o desejar.

Que o grito das ruas seja o do fortalecimento do povo, da luta pelo estado democrático de direito, sempre. E também da luta pela dignidade da pessoa humana, pois todos os brasileiros devem ter condições dignas de vida, qualquer que seja o vencedor das eleições, qualquer que seja a ideologia política a estar de plantão.

Que a imprensa cumpra o seu papel de bem informar, sem precisar pender o “braço da balança” para este ou aquele lado, como às vezes sói acontecer. Que as redes sociais não sejam usadas para distorcer a verdade. Que a Democracia seja intocada. Que a Liberdade não seja suprimida, sequer ameaçada.

Por fim, que os eleitores tenham sempre a última e verdadeira palavra. Ninguém, nesta terra, está acima deles! NINGUÉM.

 

 

*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras, da Academia Dorense de Letras, Academia Sergipana de Letras Jurídicas, Academia Sergipana de Educação e Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. 

domingo, 7 de agosto de 2022

DISCRIMINAÇÕES


  

 

José Lima Santana*

 

 

Todos deveriam ter conhecimento do que dispõe a Constituição Federal, no seu art. 3º, inciso IV, que diz constituir “objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil”: “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

Nem todos, todavia, conhecem os dispositivos constitucionais. E daqueles que têm disso conhecimento, alguns fazem de conta e até o negam, ou seja, fazem com que suas atitudes, de certo modo, contrariam o mandamento da Magna Carta. Aliás, mandamento precioso.

Por que as pessoas gostam de discriminar? A origem das pessoas é discriminada, muitas vezes.

A raça, a depender do que assim se considere, é foco de hostilizações. O sexo... As mulheres quase sempre foram alvos da mais sórdida discriminação, até no dito popular que diz: “Atrás de um grande homem há sempre uma grande mulher”. Por que “atrás”? É altamente discriminatório. Por que não “ao lado”, ao invés de “atrás”?

Apesar de tudo, as mulheres saíram às ruas, no sentido de que foram à luta. É claro, porém, que ainda falta muito para o término da discriminação. Além da discriminação, há a gravíssima situação que tem levado milhares de mulheres, todo ano, a sofrer com as agressões partidas dos arraiais da violência doméstica contra elas. Algo estupidamente vergonhoso e a merecer a mais dura reprimenda.

O que dizer das pessoas que não se enquadram como heterossexuais, acopladas numa sigla já extensa? Por que a opção sexual de algumas pessoas desperta a zombaria, a raiva, o desprezo, o desrespeito de muita gente? São pudores? São regramentos religiosos e morais? De qualquer forma, não há nada que possa justificar atos discriminatórios. A discriminação de pessoas não enquadradas no estereótipo heterossexual cresce e, em muitas vezes, geram grotescos assassinatos. Ninguém merece.

As discriminações em face da cor da pele das pessoas são trágicas. São despudoradas, são abomináveis. Além dos que discriminam de forma explícita, há os que tentam, em vão, esconder suas discriminações, tentando “tirar a coisa por menos”, mas aprofundando, ainda mais, o desrespeito ao mandamento da chamada Constituição Cidadã.

Assim como as mulheres e as pessoas não heterossexuais, as pessoas pretas, como eu, têm sido alvos das mais absurdas agressões, nos campos de futebol, nas portas de condomínios, nas ruas, em lojas e escolas, ou, seja lá onde for. Em ações policiais, os pretos estão sempre por baixo. “Vidas pretas importam”, aqui ou alhures. É mais um chavão a repetir-se? Que seja! Na verdade, é a mais escorreita constatação.

As pessoas de mais idade são desrespeitadas até mesmo dentro de casa, por filhos, netos e outras pessoas da família. É terrivelmente triste saber que as experiências dos idosos não são devidamente aproveitadas pelos mais novos.

Sociedade terrível, que aspirou por uma Constituição, após vinte e um anos de exceção, debaixo das barras de uma ditadura implantada em 1964 e derrubada em 1985. Aí está a Magna Lex. Contudo, ainda estão por surgir modos salutares de lutar contra tudo e contra todos em prol da afirmação da dignidade da pessoa humana, que, por sua vez, erigiu-se em fundamento da República Federativa do Brasil, que se constitui em Estado Democrático de Direito.

André Santana, colunista do UOL, afirmou, no dia 31 de julho, a propósito da discriminação sofrida pelos filhos adotivos do casal Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso, atriz e ator: “Todo dia, todo santo dia, ativistas, intelectuais e artista negros e negras empreendem seus esforços e seu talento para alertar a sociedade, especialmente as pessoas brancas, a gravidade do racismo, cujas consequências atingem a todos, em menor ou maior proporção. Não há como viver em paz em um mundo racista, seja qual for a cor da sua pele. A não ser para quem se empenha em manter essa praga social, negando a sua existência e reproduzindo comportamentos de discriminação e opressão contra pessoas negras. Para estes o inferno das leis. Felizmente, já há dispositivos legais para criminalizar racistas e a sociedade tem tomado conhecimento e denunciado”. A discriminação de que se fala ocorreu em Portugal. Poderia ter sido aqui ou noutro lugar qualquer.

Diz mais a Constituição (art. 3º, inciso IV): “e quaisquer outras formas de discriminação”. Quaisquer outras formas de discriminação, não dizendo quais. Nem deveria dizer. O vocábulo está posto no “plural”: quaisquer... Vale dizer, todas as formas. Todas. Elas são muitas.

Discriminar nunca foi o caminho. Jamais haverá de ser. Quem discrimina não haverá de ter tempo para ver a Luz brilhar nas trevas.

 

 

*Padre, advogado, professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras, da Academia Dorense de Letras, Academia Sergipana de Letras Jurídicas, Academia Sergipana de Educação e Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.

terça-feira, 2 de agosto de 2022

40 ANOS DE RESIDÊNCIA MÉDICA DO HOSPITAL SANTA IZABEL

                                                Gilson Soares Feitosa



 

 

Antônio Carlos Sobral Sousa*

 

 

Congratulo-me com o insigne sergipano Prof. Gilson Soares Feitosa e seus colaboradores, ao ensejo dos 40 anos de Residência Médica (RM) do Hospital Santa Izabel da Santa Casa de Misericórdia da Bahia, conceituado centro de formação especializada de inúmeros profissionais, que ocupam posições de destaque Brasil afora, inclusive em nosso estado.

Um programa pautado em projetos pedagógicos sólidos, versáteis e atualizados, que vem incorporando inovações tecnológicas em várias áreas da medicina, além das qualidades profissionais do coordenador da Comissão de Residência Médica (COREME), têm sido fatores decisivos para atrair jovens médicos de várias localidades, para a almejada especialização, naquele tradicional nosocômio baiano, no transcorrer destas quatro décadas.

As características do Prof. Gilson, de sobriedade com a responsabilidade de seu diploma de esculápio, que fizeram-no trilhar uma escalada de permanente ascensão, deferida toda ela pela confiança e habilidade de um clínico percuciente e seguro, integrado às suas lides, à sua vocação e aos seus propósitos, seguramente serviram de fonte geradora de estímulo para a prossecução dos estudos e de incentivo à concretização dos ideais de muitos hodiernos discípulos de Hipócrates.

Vale ressaltar, ainda, o reconhecido desempenho dos integrantes da RM do Hospital Santa Izabel no enfrentamento da pandemia da Covid-19, profissionais que não se furtaram de participar na linha de frente da batalha insana contra o poderoso novo coronavírus. O momento em que vivemos está a exigir de todos, esforço conjugado, vontade resoluta, mentalidade sadia, espírito forte e audacioso para vencer este inimigo versátil e traiçoeiro, que ora nos aflige, sem ódios e paixões, embasados nos princípios democráticos, cujas raízes históricas foram plantadas nos mais recuados tempos da civilização helênica, sobrevivendo às transmutações dos séculos.

Finalizo citando o estadunidense, historiador, jornalista, novelista e professor em Harvard, Henry Adams: “O Professor se liga à eternidade; ele nunca sabe onde cessa sua influência”.

 

 

* Professor Titular da Universidade Federal de Sergipe e Membro das Academias Sergipanas de Medicina, de Letras e de Educação.
 

BOTARAM SAL NO DOCE DO GOVERNADOR

PÓ DE SOVACO DE MORCEGO

      José Lima Santana*     Zé Calango esbravejou diante do prefeito: “O que é que você pensa, seu cabeça de vento? Que o povo é ...